AVALIAÇÃO Muito bom
(Paris Pieds Nus)
DIREÇÃO Fiona Gordon
ELENCO Fiona Gordon, Dominique Abel e Emmanuelle Riva
PRODUÇÃO França e Bélgica, 2016. 83 min. 12 anos.
O escracho e o grotesco ganharam tanto espaço nas comédias contemporâneas que acabamos esquecendo como sorrir pode ser mais divertido do que gargalhar.
"Perdidos em Paris", novo trabalho da dupla Dominique Abel e Fiona Gordon (de "Rumba"), retoma um tipo de humor suave, baseado num modo irônico de representar as pessoas e as coisas.
Esse retorno à essência da graça visa recuperar o duplo sentido da palavra, o gracioso e o engraçado. O trajeto leva também ao burlesco, tipo de humor feito de desajuste e desencaixe, no qual as ações desencadeiam a desordem progressiva e tornam risível nossa fragilidade.
Tudo começa quando a canadense Fiona (Gordon) recebe devolvida uma carta que enviara a Martha, tia querida que se mudou para Paris há muitos anos. Preocupada, ela embarca para a França levada pelo impulso de repor a ordem.
O motivo da busca logo desencadeia uma série de situações baseadas em desencontros e confusões. E os imprevistos só aumentam quando o acaso reúne a viajante e Dom (Abel), morador de rua adepto da vida no improviso.
As peripécias da dupla exploram as possibilidades físicas do burlesco, valorizadas com seus corpos magricelas e com gestos coreografados que alimentam muitas confusões. Nessa tradição de fazer bagunça com elegância, eles evocam antepassados como Max Linder, Jacques Tati e Pierre Étaix, praticantes de um humor equilibrista, mais irônico que anárquico.
Além da habilidade de complementar a mecânica com a dinâmica e de nos levar a uma Paris sugerida, alheia ao consumo turístico, Gordon e Abel também conquistam ao incorporar outros sentimentos, como a melancolia, ao humor.
Esse conjunto de qualidades ainda ganha um bônus com uma das últimas aparições de Emmanuelle Riva, mito do cinema francês que morreu em janeiro deste ano.
Martha é um daqueles presentes extraviados que o cinema nos entrega, um papel em que a força do olhar e da voz de Riva, impregnados em personagens trágicos, ganha outro sentido. Pimpante e lunática, a atriz envia sinais de sua alegria de viver nesse outro mundo no qual ela nunca morrerá.
Folha de S. Paulo
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