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quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Especialista em incesto comenta caso de pai que vai se casar com a filha de 18 anos nos EUA: “Atitude é condenável”

21/01/2015
 
por Daniela Carasco

Cláudio Cohen, psiquiatra, psicanalista e coordenador do CEARAS (Centro de Estudos e Atendimento Relativos ao Abuso Sexual) explica por que o incesto é um assunto tabu e diz que o pai se aproveitou de uma posição de superioridade para levar o relacionamento adiante

"AS PESSOAS PRECISAM PESQUISAR MAIS SOBRE INCESTO E GSA", DIZ GAROTA QUE SE PREPRARA PARA CASAR COM O PRÓPRIO PAI (Foto: Thinkstock)
Nos últimos dias, o depoimento dado por uma menina de 18 anos sobre a relação incestuosa que ela mantém há dois anos com o pai biológico gerou uma série de discussões nas redes sociais. Em entrevista à Marie Claire, Cláudio Cohen, psiquiatra, psicanalista e coordenador do CEARAS (Centro de Estudos e Atendimento Relativos ao Abuso Sexual), reforça o que parece ser consenso: trata-se de uma relação socialmente condenável. Nos últimos 15 anos, o especialista já tratou de mais de 300 casos de estupros agravados pelo incesto por meio do instituto, que fica em São Paulo.

O incesto provoca uma desestruturação familiar e faz com que haja uma perda da função assimétrica necessária para uma relação entre pais e filhos. Daí ele se transforma em um assunto tabu”, explica.

Em seu relato perturbador, a jovem americana narrou o reencontro com o pai biológico, após 12 anos afastada dele por imposição da mãe, que sofria de bipolaridade e outras doenças mentais. Uma semana depois desse encontro, a menina se mudou temporariamente para a casa do progenitor. Ela tinha 17 anos e ele, 36.

Cohen defende a ideia de que a menina sofreu pressão psicológica. “Até os 18 anos, considera-se que a pessoa não tem autonomia nem é capaz de fazer tudo o que deseja. Portanto, os pais precisam protegê-la e reprimi-la”, diz. “Nesse sentido, acredito que esse pai se aproveitou de uma função superior que tem. E isso é condenável.

Com a convivência, eles descobriram gostos em comum até que se viram dividindo a mesma cama. Foi com ele que ela experimentou sua primeira relação sexual. “Há uma razão para eu ter perdido a virgindade com ele - eu nunca me senti confortável com outro homem. Foi incrivelmente sensual. Nós dois tivemos orgasmos”, conta. Agora, quase dois anos depois, eles planejam se casar e ter filhos, e contam com o apoio da família dele. A garota admitiu ainda que, às vezes, o procura como pai.

E sobre o fato de a menina dizer que, às vezes, recorre ao pai como filha e não como namorada, Cohen é incisivo: “Uma vez que o pai deixa de ser pai para ter uma relação sexual, ele nunca mais vai recuperar o papel de progenitor. Não é possível exercer as duas funções simultaneamente.

A desestruturação familiar e perversão das funções familiares são as consequências mais penosas do incesto, segundo ele. “O pai vira companheiro, a mãe se torna a esposa traída, e a filha encara a mãe como uma ameaça.”

Não à toa, antropólogos como Levi-Strauss já defendiam, há décadas, a proibição do incesto como condição indispensável para o ser humano ser capaz de viver em sociedade.

O especialista também não identifica a ocorrência da Atração Sexual Genética (GSA, na sigla em inglês) usada como justificativa. “Me parece pouco lógica essa denominação, pois os casos que eles usam para justificar a sigla se restringem a relações entre filha e pai, jamais entre filho e mãe ou filho e pai. Isso só reforça o fato de a sociedade, em geral, recriminar muito mais o acesso ao corpo dos filhos pelo pai do que pela mãe.”

Apesar disso, em alguns países, como o Brasil, o incesto não é considerado crime. “De acordo com o nosso código penal, ele é apenas um agravante do crime de estupro”, explica Cohen. Isso significa que o casal poderia viver tranquilamente por aqui, já que a filha é maior de idade e, portanto, teria uma relação consentida.

Entretanto, eles enfrentariam a inviabilidade de um casamento, visto que o código civil brasileiro limita a união entre parentes próximos até terceiro grau.

“Sinceramente, o código que mais me agrada é o da Suécia, que considera o incesto um crime conta a família, não contra a pessoa específica”, conta o especialista.

Ainda segundo ele, a proibição do incesto é defendida tanto por biólogos, quanto por sociólogos e psicanalistas. As teorias biológicas concebem o cruzamento endogâmico (entre parentes) como responsável por causar problemas genéticos aos descendentes consanguíneos. Os sociólogos dizem que a exogamia (casamento entre pessoas de famílias distintas) aumenta a estrutura social da família e nos possibilita viver em um sistema mais cooperativo e democrático. Fazem coro a eles os psicanalistas, que colocam a proibição do incesto como um estruturador mental, que ajuda o indivíduo a viver com base nos valores da sociedade.

“Em resumo, todas as opiniões convergem a favor da proibição para que as pessoas possam ser humanizadas”, finaliza Cohen.

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