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sábado, 30 de setembro de 2017

Inserção de transgêneros no mercado de trabalho ainda é precária

Segundo aluna responsável pela pesquisa, trans ocupam vagas que os aceitam, não aquelas que realmente desejavam
29/09/2017

No Brasil, há uma grande restrição de oportunidades profissionais aos transgêneros, simplesmente pelo fato de serem trans. A conclusão é de Maria Carolina Oliveira, estudante de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, que realizou trabalho de conclusão de curso sobre o tema.
Segundo a aluna, muitos deles são cortados dos processos de seleção diretamente, outros são demitidos após transicionarem o gênero. “Muitas vezes estão no trabalho que as aceita, não no emprego que gostariam”, relata.

Transgênero é o indivíduo que se identifica com um gênero diferente daquele que corresponde ao seu sexo atribuído no momento do nascimento. Cisgênero é a pessoa cujo gênero é o mesmo que o designado em seu nascimento – ou seja, há concordância entre a identidade de gênero deste indivíduo com o gênero associado ao seu sexo biológico.


Além de carregar o fardo de ser a nação mundial onde mais transgêneros são assassinados (cerca de 1 a cada 25 horas), o mercado de trabalho no Brasil permanece resistente quanto ao ingresso desta população nas organizações – Foto: Pedro Ventura/Agência Brasília

Na visão da pesquisadora, o respeito profissional tende a estar ligado à cisgeneridade. Para uma parte das empresas, ser trans é um impedimento total para o ingresso e permanência na instituição. Ademais, muitos ambientes profissionais aceitam funcionários transgêneros com a premissa que estes não se “manifestem” trans, ou seja, podem permanecer no cargo caso continuem a adotar seus nomes antigos e os banheiros que sempre utilizaram.
Por fim, há instituições que tratam profissionais transgêneros com meritocracia e equidade em relação aos funcionários cis. No entanto, o déficit no processo educacional de gênero no Brasil continua a obrigar tais profissionais à exposição dentro do mercado, tendo muitas vezes que explicar a colegas o que é ser trans. Tal atitude é totalmente plausível quando encontram pessoas respeitosas e curiosas em relação ao assunto, mas gera riscos à segurança caso dialoguem com transfóbicos, sendo que nas instituições são poucos aqueles que podem ajudá-los.

Trajeto

Segundo a aluna, a vontade de pesquisar sobre grupos minoritários dentro de organizações foi direcionada aos transgêneros quando percebeu que não havia estudos deste tipo no Brasil.
Orientada pelo professor André Fischer, responsável pela disciplina de Sociologia durante a graduação, Maria Carolina começou a estudar pessoas trans dentro de um contexto organizacional.


Autora do estudo procurou entender os momentos de exposição e a vulnerabilidade que um trans vive no ambiente organizacional, analisando suas relações profissionais, o momento em que se expressa transgênero e as reações dos colegas de trabalho – Imagem: Wikimedia Commons

“No início da pesquisa, não sabia direito onde iria embasá-la”, conta. Segundo Maria Carolina, os trabalhos na área de psicologia buscavam explicar o porquê dos indivíduos serem transgêneros — algo um pouco distante de seu foco, que seria colocado sobre as estruturas e construções sociais envolvendo gênero.
Em 2016, a estudante passou um semestre na Universidade de Melbourne, Austrália, onde teve contato com construções acadêmicas relacionadas a gênero e antropologia. Usando estudos da filósofa Judith Butler e de um grande número de teóricas feministas, Maria Carolina definiu suas diretrizes metodológicas e passou a entender melhor aspectos sobre a questão que estava tratando. Segundo ela, a viagem lhe proporcionou “um bom caminho das pedras”.
Durante os meses seguintes ao intercâmbio, Maria Carolina estruturou seus objetivos de pesquisa embasados em estudos das percepções dos transgêneros em três âmbitos distintos: no trabalho, ou em sua experiência profissional; com o emprego e colegas e profissão; e com a própria organização, unindo críticas e práticas da instituição. Reunindo quatro homens trans, uma mulher trans e uma pessoa autodeclarada genderfluid (do inglês “gênero fluido”), a estudante realizou entrevistas com cada um deles, indo a fundo em diálogos sobre as mais diversas questões que envolviam transgeneridade relacionada ao mercado de trabalho.


O Brasil não tem nenhuma organização no Fórum de Empresas e Direitos LGBT. Criada em 2013, união de 24 gigantes do meio empresarial busca promover os direitos humanos, a valorização e respeito à diversidade, garantindo uma melhor qualidade de vida profissional para as pessoas LGBT – Imagem: Wikimedia Commons

“Usando como base a literatura e minha própria curiosidade, sempre com o cuidado e supervisão de meu orientador para não enviesar a pesquisa, montei uma série de variáveis e conceitos que desejava investigar, coisas que tinha vontade de entender”, comenta Maria Carolina. “Estudei as escolhas de carreira, os processos de recrutamento, a entrega de currículos, documentos e a apresentação para o meio empresarial. Procurei entender melhor os momentos de exposição dessas pessoas e a vulnerabilidade que um transpossuía no ambiente organizacional, analisando suas relações profissionais, o momento no qual se expressa transgênero e as reações dos colegas de trabalho.”
Além do conhecimento acadêmico acrescentado dentro de um tema tão restrito, Maria Carolina conta que a experiência de realizar o trabalho – envolvendo  diálogos, debates e estudo – foi pessoalmente enriquecedora. “Enquanto Maria, foi engrandecedor conversar com profissionais trans. Apesar de meu interesse no tema, não tinha contato com trabalhadores autoidentificados transgêneros”, comenta. “Para além do conhecimento institucional, o TCC constituiu também um considerável valor pessoal, muito importante para revisão de meu próprio gênero.”
Mais informações: e-mail maria.carolina.baggio@gmail.com, com Maria Carolina Oliveira

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