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terça-feira, 26 de setembro de 2017

O que é o empoderamento feminino?

por Djamila Ribeiro — publicado 25/09/2017
Nenhuma mulher pode considerar-se moderna enquanto persistirem as desigualdades
Tânia Rêgo/Agência Brasil
Protesto

O termo empoderamento muitas vezes é mal interpretado. Por vezes é entendido como algo individual ou a tomada de poder para se perpetuarem as opressões. Para o feminismo negro, empoderamento possui um significado coletivo. Trata-se de empoderar a si e aos outros e colocar as mulheres como sujeitos ativos de mudança.

Como diz bell hooks (nascida Gloria Watkins e que adotou o nome de sua bisavó e pede que o usem assim em minúsculo), o empoderamento diz respeito a mudanças sociais numa perspectiva antirracista, antielitista e antissexista por meio das mudanças das instituições sociais e consciência individuais.

Para hooks é necessário criar estratégias de empoderamento no cotidiano, em nossas experiências habituais no sentido de reivindicar nosso direito à humanidade.

Logo, o empoderamento sob essa perspectiva significa o comprometimento com a luta pela equidade. Não é a causa de um indivíduo de forma isolada, mas como ele promove o fortalecimento de outras mulheres com o objetivo de alcançar uma sociedade mais justa para as mulheres.

É perceber que uma conquista individual de uma mulher não pode estar descolada da análise política.

O empoderamento não pode ser algo autocentrado, parte de uma visão liberal, ou ser somente a transferência de poder. Vai além. Significa ter consciência dos problemas que nos afligem e criar mecanismos para combatê-los. Quando uma mulher empodera a si, tem condições de empoderar a outras.

Cada mulher em seu espaço de atuação pode criar formas de empoderar outras. Se for empregadora, pode criar um ambiente de trabalho no qual exista o respeito e que possa atender à demanda de mulheres, principalmente daquelas que são mães, e certificar-se de que não há desigualdade salarial e assédio.

Se é professora, estar atenta aos xingamentos machistas muitas vezes naturalizados como brincadeiras ou chacotas. Tentar promover discussões em salas de aula que tragam a reflexão sobre a situação das mulheres. Criar um grupo na comunidade ou associação do bairro para discutir estratégias de apoio a outras mulheres ou o enfrentamento à violência que possam vir a sofrer.

Significa uma ação coletiva desenvolvida pelos indivíduos quando participam de espaços privilegiados de decisões, de consciência social dos direitos sociais. Essa consciência ultrapassa a tomada de iniciativa individual de conhecimento e superação de uma realidade na qual se encontra. É uma nova concepção de poder que produz resultados democráticos e coletivos.

É promover uma mudança numa sociedade dominada pelos homens e fornecer outras possibilidades de existência e comunidade. É enfrentar a naturalização das relações de poder desiguais entre homens e mulheres e lutar por um olhar que vise a igualdade e o confronto com os privilégios que essas relações destinam aos homens. A busca pelo direito à autonomia por suas escolhas, por seu corpo e sexualidade.

Não é emancipação iludir-se com as novas tecnologias, enquanto persiste a divisão sexual do trabalho, enquanto o eterno feminino se impõe. E, muito menos, seguir em uma lógica de exclusão com outros grupos. Nesse sentido, é preciso cuidar para que conceitos e ferramentas políticas pensadas por feministas diversas não sejam esvaziados de sentido.

Atentar-se para o interesse de marcas com a questão e que, na maioria das vezes, é superficial e temporário. Logo, é fundamental questionar as marcas que se envolvem com o tema, confirmar se existe política de diversidade na empresa, se existem programas para mulheres que são mães para além da camiseta com a frase “girl power”.

Obviamente existe uma relação dialética: o interesse maior por essas pautas deriva da longa história de mobilização dos movimentos, que deram visibilidade a questões extremamente importantes e entenderam que trazer à tona alguns problemas seria o primeiro passo para a dignidade de certos grupos.

É preciso nomear, nos ensinaram as feministas negras. Portanto, há que se cuidar para não haver apropriação puramente mercadológica e deixar de produzir mudanças reais. Em outras palavras, é urgente pensar para além da representatividade, que inegavelmente é importante, mas possui limites.

De volta a Simone de Beauvoir: precisamos discutir a partir da experiência vivida, da concretude. Enquanto persistirem as desigualdades e as imposições de papéis sociais, não será possível considerar nenhuma mulher moderna, por mais que ela tenha o último modelo de smartphone, produzido na lógica capitalista de exploração. Não se pode aceitar que o progresso seja entendido como a manutenção de desigualdades para o benefício de um grupo social.

Pensar feminismos é pensar projetos. É discutir um outro modelo de sociedade pautado por novos marcos civilizatórios. Essa é a utopia pensada por Angela Davis e que precisamos percorrer.

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