por Tory Oliveira — publicado 01/11/2017
Pesquisadora da UFPE ganha votação popular em competição da revista Science que usa a dança para democratizar o conhecimento científico
Reprodução/Youtube
A pós-doutoranda Natália Oliveira no clipe Pop, Dip and Spin: um verdadeiro lacre acadêmico
De óculos escuros, jaleco e acompanhada por um esquadrão de dançarinos do estilo vogue, a pesquisadora pernambucana Natália Oliveira, 28 anos, venceu a edição de 2017 do concurso internacional Dance your PhD na categoria voto popular, realizado há 10 anos pela revista científica Science.
Com 78% dos votos do público, Natália apresentou por meio de um videoclipe, passos da dança e referências ao seriado CSI - que mostra a atuação de policiais forenses - o seu projeto de doutorado "Desenvolvimento de Biossensores para as Ciências Forenses”, que trata da utilização de biossensores para identificar DNA em cenas de crime, mesmo aquelas limpas com álcool ou água sanitária.
"Eu não estava esperando, mas fiquei muito feliz com o resultado", conta ela, que soube do concurso por meio de outro pesquisador do Laboratório de Imunopatologia Keiko Asami (LIKA), ligado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde ela desenvolveu sua pesquisa. "Resolvi me arriscar", resume.
Com muita malemolência e bom humor, o Dance Your PhD é uma tentativa de disseminar o conhecimento científico para além da academia, ao desafiar pesquisadores do mundo todo a sair da caixinha e explicar o seu trabalho por meio da dança. Qualquer estilo está valendo, desde que o pesquisador também sue a camisa. A iniciativa é promovida desde 2007 pela revista Science e a American Association for the Advancement of Science. Neste ano, 53 cientistas participaram da competição.
O clipe "Pop, Dip and Spin: The Legendary Biosensor For Forensic Sciences" foi gravado nas dependências da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e no centro antigo de Recife.
Nele, é encenada uma batalha entre gangues dançarinas que termina em morte. A perícia tentar descobrir o culpado, mas a cena do crime foi lavada. Para desvendar o mistério, entra em cena o biossensor desenvolvido por Natália, capaz de identificar amostras biológica de origem humana (como sangue, semen e saliva), mesmo que o local tenha sido higienizado. Legendas explicativas resumem, ao longo do clipe, a tese de doutorado por trás da dança.
Além de Natália, estrelam o vídeo os dançarinos do grupo Vogue 4 Recife, que resgatam o estilo criado por LGBTs e popularizado no mundo todo a partir da década de 1990, quando Madonna lançou o icônico clipe preto-e-branco homônimo da dança.
"Expliquei para os meninos bem direitinho a ideia da tese, eles compraram e criamos a coreografia e o roteiro", diz ela, explicando que gravou as cenas em apenas duas tardes.
A opção pelo estilo não foi por acaso.
"Vogue é muito mais que só lacrar na pista, vogue também é resistência. Quisemos trazer todos os elementos da vogue e da cultura ballroom, onde o estilo surge, para retratar também as travestis, as drag queens e as mulheres trans. Apesar de muitos pensarem que o ambiente científico é conservador, esse não é o meu ponto de vista. Então quis mostrar que a as bichas, as negras e as pobres também fazem coisas boas", resume.
O resultado é um verdadeiro "lacre acadêmico" em tempos de brutais cortes de investimentos e poucas notícias boas na área de ciência e tecnologia no Brasil.
O próprio laboratório em que Natália desenvolveu sua pesquisa sofreu com a tesoura do governo. Diante da diminuição de editais das agências de fomento, o LIKA precisou lançar mão da estratégia de aceitar também doações privadas de quantias ou equipamentos para continuar suas pesquisas.
"Quando a gente tem um vídeo desses, que mostra que estamos fazendo ciência e tendo destaque, isso dá uma lembrança para o governo de que conseguimos fazer ciência de qualidade", afirma.
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