Gabriela Guimarães e Carolina Prado
Colaboração para o UOL
28/08/2017
Uma hora, ele é incrível. Na outra, agressivo, mas logo cerca você de carinhos e declarações de amor, tentando limpar a barra pelo mal que causou. Agressores são cruéis, mas têm a capacidade de ser generosos e atenciosos, o que torna mais difícil identificá-los. Por isso, se livrar de um relacionamento abusivo é tão complicado.
“Tá louca?”
Relação abusiva nem sempre tem agressão é física. “A agressão psicológica causa tanto dano quanto as corporais. As atitudes podem se revelar por meio crises de ciúmes, ataques verbais, manipulações, proibições etc.”, afirma Ane Caroline Janiro, psicóloga pela Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo.
Foi o abuso psicológico, por meio do "gaslighting" (quando o agressor distorce informações, fazendo a vítima duvidar da própria sanidade) e da constante depreciação, que acabou com o casamento de 15 anos da administradora de empresas Karine, de 42 anos, que prefere não revelar o nome real.
“É difícil medir o tempo de abuso. É muito sorrateiro.
Tem picos, as desculpas, declarações. Cheguei a duvidar de mim mesma. Ele dizia que eu era ciumenta, louca, exagerada. Eu sempre ficava com o peso da culpa”. Quando a poeira baixava, vinham as promessas de uma vida melhor, mas durava pouco.
Um ciclo perigoso
Esses altos e baixos são extremamente comuns e configuram o que os especialistas chamam de “ciclo de agressão”. A estratégia de quem agride é deixar a vítima em constante estado de tensão, por meio de ameaças e comportamentos explosivos. Porém, quando o agressor percebe as tentativas da mulher de encerrar o relacionamento, é comum que manifeste arrependimento e afeto, para fazer parecer que a violência foi um episódio isolado.
A jornalista Camila Caringe e Silva, 30 anos, viveu um relacionamento abusivo com um amigo de infância. O namoro durou três anos, mas ela demorou para entender o que passava. “Essa longa convivência dificultou o meu discernimento em relação ao que ele fazia comigo, sobretudo antes de a violência ser grave”, conta. Depois de cada ataque, ele mudava.
“Após um episódio agudo de agressão, vem a lua de mel"
, conta. Mas, entre uma volta e outra, as agressões foram se tornando piores. “Ele chegou a falar que me mataria, com as mãos em volta do meu pescoço”. O que a mantinha ao lado de seu agressor era a admiração que ainda tinha por ele.
“Ele também teve atitudes generosas. É simpático, trabalhador, inteligente. Isso torna a cena confusa”, diz. A dúvida acabou quando ela se viu em um hospital, precisando de atendimento médico, após receber chutes.
Lado A, lado B
“O homem que abusa da parceira pode ser educado e gentil.
Com todas as outras pessoas, ele é ótimo, mas é extremamente violento com a companheira, no espaço privado”, explica Aline Yamamoto, advogada pela Universidade de São Paulo, pós-graduada em Direitos Humanos e Mulheres pela Universidade do Chile.
A descrição se aplicaria muito bem ao companheiro da advogada Isabela Guimarães Del Monde, 31 anos, que sofria abuso psicológico constante. “Não entendia como alguém que me amava poderia me tratar de forma tão raivosa e contraditória. Meu ex tinha raiva do meu sucesso profissional, dos amigos, da família e menosprezava minhas conquistas”, conta.
Para superar a violência, ela contou com acompanhamento psicoterápico e apoio em grupos feministas. “Perceber que eu não era a única a passar por aquela situação foi libertador. Finalmente eu parei de achar que era louca, como meu agressor tentava me fazer acreditar”, diz.
Como sair dessa?
Não aceite comportamentos violentos, sob nenhuma justificativa. Aos primeiros sinais de violência (falas, demonstrações de posse ou ciúme, por exemplo), diga que não admite ser tratada daquela forma. Aproveite para deixar bem claros os seus limites.
Seja realista e acredite que não está sozinha: é possível denunciar a agressão ou pedir ajuda pelo “Ligue 180”.
Mesmo que você não esteja em um relacionamento abusivo, converse com amigas sobre o assunto. É importante difundir a informação entre as mulheres.
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