O empregador que não ajuda seu empregado a se adequar à realidade de ter um filho com deficiência desconsidera a situação especial do trabalhador e o interesse da criança. Esse foi o entendimento da 1ª Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, ao reformar decisão da 23ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.
O caso chegou à Justiça depois que uma auxiliar de enfermagem teve seu pedido para trocar seu horário de trabalho do período diurno para o noturno negado pelo hospital onde trabalha. A solicitação foi feita para que ela possa levar seu filho aos diversos tratamentos que ele precisa por ser portador da Síndrome de Down.
O menino tem três anos e só a mãe tem disponibilidade para acompanhá-lo à fisioterapia, estimulação precoce, atendimento psicológico e outros cuidados necessários para minimizar os danos causados pela Síndrome. Segundo a auxiliar de enfermagem, o hospital negou seu pedido argumentando que ela deveria se submeter às regras do "banco de remanejo", como os demais trabalhadores que solicitam a troca.
Entretanto, afirmou a autora da ação, seu caso é diferente, porque seu filho precisa cuidados especiais. Disse ainda que os deslocamentos para levar a criança aos inúmeros tratamentos inviabilizam a sua jornada de trabalho no período diurno.
Ela anexou ao processo laudos de profissionais que atestaram a necessidade dos atendimentos para a diminuição de danos causados pela Síndrome de Down no desenvolvimento do seu filho, bem como a importância da mãe no acompanhamento da criança.
A troca de turno foi negada liminarmente pela 23ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, que determinou, alternativamente, que o hospital considere todos os afastamentos da mãe para levar a criança aos atendimentos médicos como faltas justificadas.
A magistrada ainda proibiu o hospital de fazer qualquer desconto por conta das ausências. Descontente com esse entendimento, a trabalhadora impetrou mandado de segurança no TRT-4. Também liminarmente, o desembargador Marcelo José Ferlin D'Ambroso determinou que o hospital admitisse a troca de turno imediatamente.
Um mês depois da liminar em segundo grau, a 1ª Seção de Dissídios Individuais do TRT-4 ratificou a decisão monocrática. No voto de mérito, D'Ambroso criticou a atitude do hospital afirmando que ela desconsidera a situação especial da trabalhadora e o interesse da criança, que comprovadamente necessita de cuidados especiais.
O desembargador lembrou que Lei Brasileira da Inclusão da Pessoa com Deficiência (13.146/2015) estabelece, em seu artigo 5º, que a pessoa com deficiência estará protegida de todas as formas de negligência, tratamentos desumanos ou degradantes, dentre outras violações. A LBI também define que devem ser considerados especialmente vulneráveis para os fins da proteção as crianças, os adolescentes, as mulheres e os idosos com deficiência.
O diploma legal atribuiu ao Estado, à sociedade e à família, disse o desembargador, o dever de efetivar com prioridade à pessoa com deficiência direitos como saúde, educação, habilitação e reabilitação, dentre outros advindos da Constituição Federal, da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência e de outras normas.
O relator destacou, ainda, que o filho da trabalhadora foi adotado, lembrando que, conforme dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), apenas 3% dos adotantes escolhem crianças com deficiência intelectual para adotar, e somente 32,7% dos pretendentes admitem adotar uma criança com outras doenças detectadas.
"Não vislumbro prejuízo à litisconsorte na concessão no pedido liminar, porquanto, conforme constou em sua manifestação no processo subjacente, conta com cerca de 9 mil empregados, não sendo possível vislumbrar que a realocação de uma única trabalhadora, que possui circunstâncias especiais autorizadoras, possa causar tanto transtorno", concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-4.
Processo 0021755-54.2017.5.04.0000
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