Milhares de pessoas se manifestaram neste sábado (20) emWashington, Nova York, Los Angeles e dezenas de outras cidades importantes dos Estados Unidoscontra as políticas conservadoras de Donald Trump, quando se completa um ano de sua chegada à Casa Branca e, também, de uma primeira Marcha das Mulheres que - então não se sabia - seria o primeiro símbolo de um tremendo vendaval feminista em escala global. Entre camisetas com o rosto da Princesa Leia, a heroína deStar Wars, citações históricas de Eleanor Roosevelt e múltiplas referências apussy(gíria norte-americana para vagina) - “Pussy power”, “Estapussytem garras”, “Sou a única proprietária da minhapussy” - o protesto mostrou sua musculatura ao longo do espelho d’água do monumento a Lincoln na capital norte-americana. Trata-se de um lugar carregado de simbolismo, ondeMartin Luther Kingproferiu o famoso discurso “Eu tenho um sonho”.
Mais que de sonhos, porém, a jovem Jamie Albaum recitava queixas na manhã deste sábado, diante da escadaria do monumento. “A igualdade entre homens e mulheres já está escrita nas leis, mas não é real na prática, e eu estou aqui lutando por isso.” Albaum, de 22 anos, é das que acreditam que 2017 foi um divisor de águas no movimento feminista, que marcará um antes e um depois nas reivindicações contra a discriminação e o assédio. Quando perguntada sobre o risco de uma onda de puritanismo surgirem decorrência de tantos protestos, ela arqueia as sobrancelhas até que estas se destaquem sobre os óculos de sol: “O assédio é um problema muito grave para muitas mulheres no trabalho. Não estou de acordo com quem diz que é uma caça às bruxas. Não é, porque é só questão de tempo até que se os perpetradores sejam levados à Justiça por crimes que duraram muito tempo”.
A manifestação do ano passado em Washington foi uma das maiores da história norte-americana, convocada para protestar contra a chegada ao poder de um candidato que se caracterizou por seus pronunciamentos racistas e machistas, e que também foi alvo de sérias acusações de assédio. Já o protesto deste sábado reuniu bem menos gente, mas tinha uma pauta muito clara: derrotar os republicanos nas eleições legislativas de 2018. A ONG Emily’s List, que promove a participação das mulheres na política, afirma que, desde a eleição presidencial de 2016, 25.000 mulheres procuraram seus escritórios para manifestar a intenção de disputar algum cargo eletivo. Em 2016, um ano eleitoral, apenas 920 tomaram essa iniciativa. A resistência a Trump parece menos febril, porém mais organizada, após estes 12 meses de políticas sociais regressivas em assuntos como aborto, direitos LGTBs e imigração.
“Agarre ele pelas legislativas”, propunha um cartaz, parafraseando a frase que Trump disse na gravação de um programa televisivo uma década atrás, quando se vangloriava de poder assediar as mulheres graças à sua fama e seu poder: “Você pode fazer o que quiser, agarrá-las pela boceta”. Há quem veja na Marcha das Mulheres a semente do que foi o movimento antiassédio Me Too (“eu também”). Em Nova York, Tarana Burke, que criou o lema há mais de uma década, incentivava os manifestantes: “Somos mais fortes que o medo”, clamou. “Os homens de qualidade não temem a igualdade.”
O protesto reuniu mais de 200.000 pessoas nas ruas de Manhattan. “Havia muita raiva pela chegada de Donald Trump” no ano passado, recorda Katherine Siemionko, uma das organizadoras, “mas agora já não é por ele, é por nós”. Isso explica que a Marcha das Mulheres tenha se tornado um fenômeno global, e que as manifestações, como já ocorreu há um ano, se reproduzam em diversas cidades do mundo ao longo do fim de semana.
“As mulheres se ergueram porque perceberam que não há igualdade e entenderam que precisavam agir rapidamente”, disse Siemionko, “porque esta Administração não vai proteger seus direitos mais básicos. Tampouco os direitos dos imigrantes, da comunidade LGBTQ+, dos deficientes e dos não brancos”.
Nova York é há décadas o lar dessas comunidades. É a metrópole mais diversificada do país e a que se gaba de ser o porta-estandarte da igualdade. Por isso, a cidade dos arranha-céus virou, desde a vitória de Trump, o grande eixo da resistência contra as políticas que emanam de Washington. “Suas leis destroem os sonhos de milhões”, denunciava outro dos cartazes.
Em Nova York, ao final do protesto organizou-se um evento que tinha como objetivo arrecadar fundos para ajudar as mulheres com aspirações políticas a apresentarem suas candidaturas. “O próximo passo são as urnas”, dizem as responsáveis pela campanha VoteRunLead (“vote-concorra-lidere”).
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