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sábado, 14 de julho de 2018

Uma voz singrando as águas

Filme de Letícia Simões (na foto), no Festival Mulheres no Cinema, hipnotiza ao narrar as memórias de um escritor da Ilha de Marajó e seu amor particular

Por Inês Castilho
O Chalé é uma ilha batida de vento e chuva, da carioca Letícia Simões – um dos seis filmes da mostra competitiva nacional do Festival Internacional de Mulheres no Cinema(FIM), que acontece em São Paulo até dia 11 – me cativou com seu afeto, ritmo, delicadeza.

“O título vem de um capítulo do primeiro livro de Dalcídio, Chove nos Campos de Cachoeira, em que ele narra a enchente que acometeu sua casa, o chalé, levando com as águas suas memórias e as parcas roupas” – explica Letícia sobre o título perturbador que escolheu para seu filme.
O Chalé narra cartas de Dalcídio Jurandir (1909-1979), escritor nascido na Ilha de Marajó com 11 livros publicados, amados na Amazônia mas pouco conhecidos por aqui. Em 1939, recém-saído da prisão por protestar contra a ditadura Vargas, aceita o único emprego que lhe aparece: o de inspetor das escolas da maior ilha fluvio-marítima do mundo. São as cartas que escreve à mulher amada, Guiomarina, e ao filho de 9 meses, Alfredo, que Letícia Simões narra nesse filme.
O que vemos são poças trêmulas de luz resplandescente no negrume de águas sem começo nem fim, enquanto o cotidiano da vida se desenrola nos barcos, nas escolas, na roça, nas praças. Imagens se sucedem enquanto a voz encarnada de Letícia lê as cartas de Dalcício, numa entonação que flutua no balanço das águas, territórios e rostos que a imagem vai revelando – “sem uma devorar a outra”, como disse Letícia em rápida conversa depois da projeção.
O olhar vai em busca do que há de permanente, e é como se acompanhássemos agora Dalcídio em sua viagem. Assim ficamos sabendo como ele detestava aquele emprego, em que era constantemente convidado a mentir sobre os parcos recursos das escolas visitadas, sobre o salário minguado que mal dava pros gastos – e contudo resistia seu encantamento e amor pela vida e por aquele povo. Ficamos sabendo sobretudo do profundo, delicado afeto que devota a Guiomarina e Alfredo. Esse o presente maior deste filme: o amor de um homem sábio e gentil por uma mulher de dedos ágeis, olhos profundos, juntos em sua luta pela vida.
Letícia Simões estudou cinema na PUC-Rio e na Academia de Artes de Londres. Está em montagem de novo filme, mais um em sua já extensa filmografia: além do Chalé(2018), realizou Manual (2016), Tudo vai ficar da cor que você quiser (2014), A geografia é algum lugar entre o coração e aquilo que já foi (2013) e Bruta aventura em versos (2011). É ainda escritora com vários livros publicados.

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