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domingo, 26 de maio de 2019

Constitucionalidade do divórcio impositivo é questionável

Desde a Emenda Constitucional 66/2010, a decretação do divórcio foi simplificada, eis que não foram mais exigidos prazos para tanto. A mesma norma trouxe, ainda que sob divergência doutrinária, o fim da discussão de culpa pelo término do casamento. Desta forma, o instituto passou a ser um direito potestativo (que não admite contestações) de cada um dos cônjuges, pelo que, para a sua decretação, basta apenas a vontade de um deles.

Dando aplicação, ainda que tardia, à finalidade da emenda constitucional, a Corte Especial do Tribunal de Justiça de Pernambuco aprovou, por unanimidade, o Provimento 06/2019, editado pela Corregedoria-Geral da Justiça daquele tribunal, que permite a realização do divórcio impositivo.
Pernambuco foi o primeiro estado a aprovar tal permissão, que passou a valer desde 14 de maio, suspendendo a necessidade de judicialização do divórcio.
No dia 20, a Corregedoria-Geral de Justiça do Maranhão instituiu o Provimento 25/2019, com o mesmo objetivo.
Por autorização deste provimento, qualquer dos cônjuges, acompanhado por seu advogado ou defensor público, poderá unilateralmente requerer a decretação do divórcio diretamente no Cartório de Registro Civil em que foi celebrado o seu casamento.
Após o pedido, o outro cônjuge receberá uma notificação apenas para ter ciência prévia do pedido. No prazo de cinco dias após a efetivação da notificação pessoal, será procedida a averbação do divórcio impositivo na certidão de casamento das partes, dispensando qualquer manifestação do outro consorte.
Caso o cônjuge não seja encontrado no endereço indicado ou as buscas do local em bases de dados sejam insuficientes, a notificação será feita por edital.
A única exigência para tal procedimento é que o casal não tenha filhos menores, por nascer ou incapazes, eis que, para esses casos, seria necessária a intervenção do Ministério Público.
As discussões relativas à partilha de bens, pensão alimentícia e medidas protetivas deverão ser tratadas em procedimento próprio perante o Judiciário ou por meio de escritura pública, quando houver consenso.
Para Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam), “o provimento vem reforçar a máxima da substituição do discurso da culpa pelo da responsabilidade, espelhando a interpretação finalística da Emenda Constitucional nº 66/2010 — que foi elaborada pelo IBDFAM — que facilitou o processo do divórcio. Vejo como avanço a possibilidade de qualquer dos cônjuges requerer diretamente no Registro Civil o divórcio, pois preservou o espírito da EC nº 66/2010 cujo o propósito é a simplificação, facilitação, menor intervenção estatal, liberdade e maior autonomia privada, além de não se discutir a culpa, acabando, via de consequência, com prazos para decretação do divórcio”[1].
Contudo, o presidente do IBDFam-MA, Carlos Augusto Macedo Couto, destaca um ponto negativo do divórcio impositivo: “segundo ensaio de notário, nosso associado, tomando por base a lei de custas do Estado do Maranhão, o aumento dos emolumentos seria, em tese, superior a 100%. Além disso, o divórcio impositivo pode parecer a banalização da dissolução do vínculo conjugal, se comparado com as formalidades do matrimônio”[2].
Apesar de o provimento atender ao necessário desafogamento do Poder Judiciário e a desburocratização da realização de procedimentos simples, a sua constitucionalidade é questionável. Isso porque na legislação civil estão previstas apenas duas modalidades de divórcio: o que for decretado judicialmente e o formalizado por meio de escritura pública.
Nesse sentido, a tabeliã Priscila Agapito, presidente da Comissão Notarial e Registral do IBDFam, destaca que “a lei 11.441/07 que cuidou da desburocratização dos procedimentos de separação, divórcio e inventário já determinou que há necessidade de intervenção do ente estatal para a formalização de vontade e esclareceu transparentemente que se trata ou do juiz ou do notário, ambos imparciais. É requisito de validade. A meu modesto entender, não pode um provimento mudar, alterar uma regra legal, suprimindo a presença do juiz ou notário, banalizando a solenidade da dissolvição do casamento. O registrador civil não tem atribuição para realizar o casamento, mas sim, o juiz de paz. O registrador apenas reduz a termo o que presenciou, dando publicidade erga omnes àquele fato jurídico”[3].
No dia 20, o corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, instaurou um pedido de providências para que a CGJ-PE preste informações sobre o novo provimento, inclusive no que diz respeito aos emolumentos, cumprimentos etc. No pedido, destacou que a competência para edição desses provimentos seria do CNJ, e não das Corregedorias estaduais.
Desta forma, embora elogiável o novo provimento, eis que ninguém permanecerá casado se assim não desejar, será necessária a análise pelo Conselho Nacional de Justiça, para aplicação em território nacional, bem como a previsão legal do divórcio impositivo, com a inclusão deste procedimento na legislação civil atinente ao Direito de Família, a fim de evitar discussões acerca de sua constitucionalidade.

[1] TJPE aprova provimento que possibilita o “Divórcio Impositivo”. Disponível em <http://www.ibdfam.org.br/noticias/6941/TJPE+aprova+provimento+que+possibilita+o+%E2%80%9CDiv%C3%B3rcio+Impositivo%22>. Acesso em 16.mai.2019.
[2] CGJ-MA também aprova provimento que institui o “Divórcio Impositivo”. Disponível em <http://www.ibdfam.org.br/noticias/6942/CGJ-MA+tamb%C3%A9m+aprova+provimento+que+institui+o+%E2%80%9CDiv%C3%B3rcio+Impositivo%E2%80%9D>. Acesso em 24.mai.2019.
[3] TJPE aprova provimento que possibilita o “Divórcio Impositivo”. Disponível em <http://www.ibdfam.org.br/noticias/6941/TJPE+aprova+provimento+que+possibilita+o+%E2%80%9CDiv%C3%B3rcio+Impositivo%22>. Acesso em 16.mai.2019.
 é advogada do Escritório Professor René Dotti, especialista em Direito de Família e Sucessões e secretária-geral da seção paranaense do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam).

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