Claudio Fachel/SSP-RS |
11/03/2015
Iniciativa pioneira evitou o assassinato de 8.568 mulheres no RS Uma iniciativa pioneira no país evitou a morte de 8.568 mulheres sob ameaça nos últimos dois anos. Esse é o principal balanço da atuação da Patrulha Maria da Penha, criada em outubro de 2012 pela Brigada Militar do Rio Grande do Sul. A proteção foi garantida por meio de 17.220 visitas de patrulheiros às residências dessas mulheres para inibir a presença dos agressores. Nesse período, 98 homens foram presos.
“Felizmente, nenhuma mulher que contou com o nosso serviço foi vítima de feminicídio. A gente percebe que foi uma árdua estrada até chegarmos a esses resultados”, comemora a tenente-coronel Najara Santos da Silva, que atua junto à coordenação estadual do serviço. Para ela, a conquista foi obtida por meio de muito trabalho, muita dedicação das patrulheiras e patrulheiros e muita abnegação.
De acordo com a policial, o índice de feminicídio no estado caiu 25,7% desde a criação da patrulha até dezembro de 2014, de 101 para 75 casos. Houve também redução de outras formas de violência contra a mulher: o número de estupros caiu 23%, de 1.374 para 1.051 crimes; as ameaças diminuíram 2,8%, de 44.493 para 43.680 episódios e as lesões corporais, 6,8%, de 27.147 para 25.298 casos.
A patrulha foi criada por meio de portaria do Comando-Geral da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, de 4 de outubro de 2012, e leva o nome da biofarmacêutica cearense Maria da Penha Fernandes. Ela foi vítima de violência doméstica e se tornou o principal símbolo da defesa dos direitos da mulher no país. Maria da Penha também empresta seu nome à Lei n. 11.340, de 7 de agosto de 2006, que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Ronda – O serviço começou a ser prestado em quatro bairros com altos índices de violência da capital Porto Alegre. No mês seguinte, passou a ser realizado também na cidade de Canoas. Atualmente, o patrulhamento conta com 29 viaturas que cobrem 21 municípios gaúchos: Porto Alegre, Cachoeirinha, Canoas, Esteio, Charqueadas, Caxias do Sul, Passo Fundo, Santa Cruz do Sul, Vacaria, Pelotas, Alvorada, Cruz Alta, Novo Hamburgo, Santana do Livramento, Uruguaiana, Gravataí, Viamão, Rio Grande, Lajeado, São Leopoldo e Venâncio Aires.
Cada viatura do serviço tem efetivo mínimo de dois policiais, um homem e uma mulher. O veículo leva o nome Patrulha Maria da Penha em um adesivo no vidro traseiro. Todos os militares envolvidos passaram por curso de capacitação. Até hoje, foram realizadas 19 edições do curso que aborda os seguintes temas: estudo técnico sobre violência doméstica e medidas protetivas e dados estatísticos; local de crime e preservação das provas psíquica e física; principais procedimentos de atendimento e encaminhamento de mulheres vítimas de violência à perícia; policiamento comunitário; visão policial da Lei Maria da Penha; atribuições da Secretaria de Política para Mulheres; e direitos humanos.
No Rio Grande do Sul, os procedimentos voltados à proteção à mulher ocorrem da seguinte forma: ao registrar ocorrência na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), a mulher é orientada a formalizar uma solicitação de medida protetiva de urgência. A solicitação é encaminhada pela delegacia à Justiça, encarregada de deferir ou não o pedido. Entre as medidas protetivas estão a obrigação de o agressor se afastar do lar e o impedimento de ele se aproximar da vítima.
Diariamente, as viaturas da Patrulha Maria da Penha se dirigem às delegacias e verificam as solicitações de medidas protetivas formalizadas pelas vítimas. Em seguida, os patrulheiros selecionam os casos mais urgentes e, antes mesmo da decisão da Justiça, as viaturas se dirigem às residências das vítimas para fazer a proteção.
“Na verdade, a gente nem fica sabendo se a medida protetiva foi concedida ou não pela Justiça. Ficamos sabendo por meio das próprias vítimas, que acabam contando. O patrulhamento prioriza os casos em que há a explícita manifestação do agressor em voltar e matar a vítima”, explica a oficial da Brigada Militar. Dependendo da situação da vítima, a frequência das visitas pode variar, sendo definida caso a caso de acordo com o contexto verificado pelo patrulheiro junto à vítima. Com este procedimento, das 8.568 mulheres atendidas pela patrulha desde a criação do serviço, 3.948 tiveram as solicitações de medidas protetivas de urgência deferidas pela Justiça.
Denúncia – A tenente-coronel destaca que, por medo, paixão pelo agressor ou dependência financeira, muitas mulheres não denunciam a violência sofrida. “Mas muitas dessas mulheres que não denunciam por conta da dependência já sofrem um outro tipo de agressão, que é a agressão patrimonial, porque os maridos, às vezes, nem as deixam sair de casa para trabalhar, e isso em todos os níveis”, conta. Ela cita o exemplo de uma vítima que teve de ser acompanhada pela patrulha, da residência até o aeroporto, sob proteção, para embarcar de volta para sua casa na Bahia. “Ela era casada com um engenheiro de uma empresa de telefonia, que a proibia de trabalhar, não lhe dava dinheiro e ela vivia numa situação muito precária dentro da própria casa”, lembra a policial.
Perguntada sobre que orientação daria às mulheres temerosas em denunciar a violência, Najara respondeu: “Que não tenham medo de romper esse ciclo de violência. Medo de o agressor voltar a agredi-la, medo de perder os filhos, de não ter dinheiro para sobreviver, é muita insegurança. O primeiro passo é não ter medo, é ter coragem de ir até lá, de denunciar, de mostrar que é capaz de viver sozinha. É ter um pouco de amor próprio também, porque muitas delas são apaixonadas pelo agressor, já que no coração a gente não manda. Isso faz com que elas se submetam a todo tipo de humilhação e de agressão”.
Jorge Vasconcellos
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