COLÉGIO EQUIPE
18 Março 2015
“Se, na conjuntura, o poder jovem cambaleia, vem aí, com força total, o poder ultrajovem.”
Carlos Drummond de Andrade,
da crônica: “Quero lasanha”
da crônica: “Quero lasanha”
Na crônica anterior, apresentamos os blogs dos alunos e alunas do 8° ano (link). Cada cronista, atento ao mundo de dentro e de fora, escreve sobre os mais variados assuntos e pensamentos. E no que pensam as crianças?
As crianças do 8° escrevem sobre o fato de não serem mais crianças, sentem saudades da infância, das brincadeiras de um antigamente onde se brincava na rua, na escola, na vila. Sobretudo, quando se brincava com os amigos e amigas, todos juntos, e não cada um na sua, frente à tela de um computador:
“Em sua infância, você brincava de esconde-esconde, pega-pega, pique-bandeira? Eu gostava de brincar de tudo isso, em vários lugares: na rua, no prédio, no hotel. Mas o que eu mais gostava era de me divertir com meus amigos, em conjunto. Não ficar trancado em um quarto e jogar videogame sozinho, pois na época não tinha os videogames mais avançados que jogamos hoje em dia, todos nós jogamos juntos.”
Falam sobre o passado, as aventuras e lembranças de um tempo em que subiam nos telhados para pegar a bola que lá ficou. Sim, essas crianças de hoje, tão século XXI, jogaram muita bola, brincaram bastante na rua. E perguntam-se: onde foram parar as crianças? Onde foi parar o rosto infantil que agora não habita mais o espelho?
“Como vão embora?
Ver a porta do último quarto do corredor aberta me faz olhar as fotos do mural da minha mãe, pensar pra onde foi a menina que eu era e aqueles sorrisos sincronizados das fotos.”
“Quando menor, eu gostava muito de subir no telhado da casa onde eu moro. Moro em uma vila, então uma passarela de quatro telhados era meu passaporte para a diversão. E era algo tão cotidiano: agarrar-me ao cano da casa 6 e subir com os pés empurrando os tijolos até o topo, e sentar na superfície de concreto. Antes havia mais crianças, agora só me resta o tal sobrinho da vizinha que nunca vem e o pequeno da casa1.”
Em suas crônicas, os alunos e alunas do 8° ano reclamam das coisas chatas de crescer.
Uma delas, indiscutível: nenhum presente é tão bacana quanto os presentes que as crianças ganham:
“Sem contar que quando você passa de seus 8 anos, nunca mais ganha presentes legais, já era! Acabou a fase de ganhar aquela “Casa dos sonhos da Barbie”, ou até aquele brinquedo que você põe água dentro, e aperta a torneirinha que sai a água, e lava a “louça” toda suja de terra, ou até mesmo aquele brinquedo que contém uma areia “mágica” que quando você põe água, ela não molha (…). O máximo dos presentes que eu ganho hoje em dia são roupas (que eu adoro) e maquiagens (que eu não uso).”
Os estudantes cronistas do Colégio Equipe escrevem sobre as aventuras da vida, as aflições, os grandes desafios: ficar acordada até muito tarde, lendo, jogando, conversando com os amigos. Passar mais de um mês sem arrumar o quarto. Roubar comidas da geladeira, na fome da madrugada:
“Ah! Final de semana. Meus únicos dias reservados exclusivamente para o computador, amigos virtuais e jogos, além da melhor comida já feita na semana. Dia de colar a bunda na cadeira… Não, meu pai diz outra coisa.
Doze vezes por ano, uma vez por mês esse dilema é totalmente dilacerado pelas palavras supremas do mais forte:
‘Bibi, vai arrumar seu quarto.’”
“Quando bateu meia- noite, meu pai chegou no quartinho onde jogamos, no fundo da casa, e estabeleceu um limite de até 2h da manhã para ficarmos lá combatendo os inimigos Annie, Renekton, Taric, Miss Fortune e outros. Mas como eu tinha um amigo em casa, decidimos ser um pouquinho teimosos e ultrapassar esse limite.”
“É sempre assim, toda vez que uma amiga vem dormir aqui em casa, a gente fica conversando até muito tarde, quando a gente sente aquele soninho, bate aquela fome… e a gente sente aquele medo de ir até a cozinha e os meus pais chegarem e mandarem a gente dormir.”
Os cronistas e as cronistas do oitavo ano escrevem sobre os cuidados de mãe, às vezes travestidos de estranhos remédios:
“Hoje de manhã, eu acordei com a minha garganta me matando, e meu nariz mega entupido, e eu contei para minha mãe, e isso com certeza foi uma das piores coisas que eu já fiz em toda a minha vida, porque ela me apareceu com um suco de alface, rúcula, laranja e gengibre, e sinceramente, nunca provei nada pior …”
“-Filho, vai escovar os dentes!
- Já escovou os dentes né?!
- Eu vou proibir esse negócio aí, hein?!
- Para com isso! Vai ler alguma coisa, vai!
- Já escovou os dentes né?!
- Eu vou proibir esse negócio aí, hein?!
- Para com isso! Vai ler alguma coisa, vai!
- Sai dessa internet!”
Nossos cronistas enfrentam assuntos difíceis: refletem sobre a morte, a perda de pessoas queridas, de amores. Contam de conversas importantes em família, do processo do luto e do desejo de ter conhecido mais, convivido pais, curtido mais os avós, bisavós… Parentes que habitam memórias e histórias:
“Fomos rumo ao cemitério, ficamos a olhar uma pedra retangular sobre o chão, e colocamos umas pedrinhas sobre ela. Meu pai deu as costas, mas eu, em protesto, sentei-me num banco reclamando: eu não iria embora antes de ver a minha Vó. Ele se sentou ao meu lado e, com toda a paciência do mundo, disse que minha Vó não estava mais no mundo material, que sua vida terrena havia se acabado, mas que sempre estaria no meu coração e nas histórias que ele me contava, mesmo que eu nunca a tivesse conhecido pessoalmente.”
“Sabe quando seus parentes começam a falar sobre seus antepassados e dizem como eram legais e sobre as coisas que faziam? Bom, isso acontece várias vezes comigo. Normalmente falam sobre meu bisavô por parte de mãe, ele faleceu dois anos antes de eu nascer. E quando minha mãe, minha vó e meus tios começam a falar sobre ele, começo a pensar: ‘ Bem que ele podia ter aguentado mais três anos, para que eu pudesse ver seu rosto e o conhecer por um ano…’ ”
“Eu imaginava uma pessoa indo pro Céu, batendo as botas (uma coisa bem bizarra)… Depois de um tempo, eu entendi que essa frase queria dizer que a pessoa morreu, mas até hoje, nunca entendi por que as pessoas usam essa frase, pois bater as botas para mim não tem nada a ver com morrer.”
“Como alguém que dizia que te amava, de uma hora para outra simplesmente não te ama mais? O que será que faz uma pessoa deixar de te amar? Será que ele acaba quando eu sento no sofá para ver TV? O amor tem um botão liga e desliga? E depois, para onde o amor vai?”
E, finalmente, fazem-se perguntas fundamentais. Perguntas sobre a existência, as injustiças da vida, o fim das coisas:
“Como assim, filmes, livros, risos, romances e a vida acabam quando menos queremos? Tentamos fazer com que as melhores coisas durem pra sempre e as piores acabem de uma vez, porém é tudo ao contrário: as melhores acabam rápido e as piores parecem que duram para sempre!”
“O fim tem muitos lados, mas vou falar dos dois principais. De um lado tem a perda e o esquecimento e do outro, tem a graça e a beleza. Não existiriam leitores nem escritores sem o final: os livros virariam um infinito. Mesmo se não existissem livros nem finais: nós ficaríamos vagando, procurando uma cura para a imortalidade.
O final coroa os livros, dá importância para eles, para tudo que acaba. Faz com que a gente tenha a capacidade de chamar algo de querido e precioso, algo de seu.”
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