06 de março de 2015
DILSO JOSÉ DOS SANTOS
Professor
Acho que nos últimos tempos comprei o equivalente a uma motoca e alguns ternos novos _ investi tudo em livros. Moto alguma conseguiria tal quilometragem, seria incapaz de me levar para as lonjuras de tantos interiores. Vida simples a minha, sem gravatas, mas sempre viajando de primeira classe, ostentando para ninguém as roupas caras que me vestem por dentro. Parece tolice, não parece? Minha felicidade é assim.
Ontem mesmo comprei alguns. No entanto, entre os muitos encontrei um que me chamou à primeira leitura: Mulheres: filosofia ou coisas do gênero. Trata-se, como afirma uma das organizadoras (Márcia Tiburi), de um mosaico de artigos, um caminho de tijolos coloridos que nos (en)caminham para o mesmo lugar. Confesso que ainda estou lendo, fiz isso hoje enquanto meus alunos se empenhavam em atividades de aula. Fiquei ali, tentando digerir as tantas acusações históricas, no que se refere à mulher. Sou suspeito em falar, minha dissertação de mestrado se locomoveu com esse mesmo tema: a representação do feminino na literatura… Sim, a mulher está presente em mim, porque todos somos um pouco do outro. Não defendo a ideia de fragilidade (e tenho motivos pessoais para isso, já conheci muitas pessoas poderosas, muitas!). Ninguém deveria ser medido tão “genericamente” assim. Homens, mulheres, homossexuais, homoafetivos… O que é isso?
No passado, em Portugal, uma de minhas poetas favoritas não aguentou a pressão social exercida pelos homens da primeira metade do século 20. Tudo por ousar estudar; fumar charutos, não como vício apenas, mas como ato de liberdade, uma vez que não era permitido às mulheres fumar, divorciar-se, pensar…; casou-se algumas vezes, inclusive, em um dos casamentos, libertou um amigo das vicissitudes sociais e o escondeu nos laços da aliança, ele era homossexual, se hoje difícil, imaginem como era a vida de um deles naquela época. Contudo, por volta dos trinta e poucos anos, não suportou, matou-se por pura pressão. Pena, nasceu em um tempo raivoso. Morreu, bebeu sua “cicuta”, só que, antes, um poema brotou de suas mãos. Uma conversa com aquela que a levaria, a Morte.
Não, minhas amigas e amigos, “ninguém nasce mulher, torna-se mulher”. Somos o tanto de pessoas que nos influenciam: homens grandes, pequenos; mulheres grandes, pequenas _ caso queiram separar por gênero e qualidade. Como eu disse, o ‘genérico’ é frio, prefiro acreditar que sou também um pouco de todos: Chico Buarque, Simone de Beauvoir, Florbela Espanca. Sim, também sou mulher, sou homem: temperos bonitos.
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