Durante a vigência da política, mulheres se tornaram mais bem educadas academicamente e bem sucedidas em suas carreiras
06/11/2015 / POR YE LIU*
A decisão do Partido Comunista Chinês de acabar com a sua infame política de um filho só possui um significado além do seu impacto na demografia do país. O que estava faltando em todas as discussões e reflexões em torno do impacto da política no tamanho da força de trabalho e nos direitos humanos das famílias é as consequências positivas no controle da população – particularmente para a educação das meninas.
A política de um filho só, apresentada em 1978, abriu oportunidades educacionais para as garotas urbanas. Antes dessa introdução, famílias grandes investiam um pouco em cada criança e priorizavam seus recursos em favor dos filhos em vez das filhas.
Mas quando os pais foram restringidos a ter somente um filho, e quando calhava de ser uma menina, ela se beneficiava em ser o foco de todas as aspirações e investimentos. De acordo com um estudo de 2002, famílias urbanas tiveram expectativas educacionais iguais para crianças de ambos os sexos e investiam na educação do filho único, independente do gênero.
O aumento da participação das mulheres da geração de um só filho na educação superior também tem sido significativa. O gráfico abaixo ilustra a escala da expansão, ao comparar os índices de progressão com a educação superior do grupo do nascimento selecionado e a porcentagem da representação de mulheres na educação de nível superior de acordo com essa medida.
Selecionei dois grupos de idades que representam gerações antes de a política de um filho só ser introduzida em 1978, e três grupos que cobrem a "geração um filho só". Para os nascidos antes da política, mulheres contavam como 30% da educação superior total da população: homens tinham duas vezes mais representação na educação superior do que mulheres. O aumento disso foi para 41% para o grupo de 1980-82 e quase 50% para o grupo de 1990-92. Fica claro que a política foi acompanhada por um crescimento na participação das mulheres na educação superior.
Ativismo social e político
A geração de um filho só tem sido criticada por ser constituída por pequenos "imperadores" ou "princesas" vivendo em famílias 4-2-1, compostas por quatro avós, dois pais e um neto. O individualismo deles frequentemente relacionado à decomposição da cultura chinesa tradicional.
Eu descobri que a geração de um filho só é tudo que não irresponsável. Eu tenho conduzido entrevistas individuais aprofundadas com mulheres e homens da geração de um filho só que estiveram matriculados na educação superior ao longo dos últimos nove anos. Minha pesquisa iminente ilustra um quadro diferente da percepção que é disseminada sobre o grupo dos "pequenos imperadores".
As 24 mulheres filhas únicas que eu entrevistei em oito universidades da China em 2007 no geral tinham grandes aspirações, independente do passado cultural ou socioeconômico que tiveram. Elas eram mais envolvidas socialmente com o ativismo ambiental, como a promoção da importância da reciclagem, a economia de água e a conscientização em torno da poluição do ar, do que os homens filhos únicos que entrevistei, e que as outras 24 mulheres que não vieram de famílias que tinham um só filho.
As mulheres filhas únicas também eram mais ativas politicamente nas universidade: mais delas se filiaram ao Partido Comunista Chinês do que seus colegas. Das 24 mulheres filhas únicas, 20 se filiaram, comparadas às 13 que tinham irmãos e cinco dos estudantes homens. As mulheres filhas únicas explicaram ter adotado o ativismo político para minimizar as desvantagens sociais e de gênero que experenciariam na transição da universidade para o mercado de trabalho.
A geração de um filho só também já foi relacionada ao enfraquecimento da cultura patriarcal - onde a propriedade e as riquezas são passadas para o lado masculino da família. Isso resultou em pais urbanos que deram aspirações e investimentos iguais para suas filhas e assim criaram uma geração de mulheres com maiores diplomas educacionais.
As mulheres urbanas poderiam ser prejudicadas
Quando a política de dois filhos ganhar força na China em 2016, as mulheres das áreas urbanas provavelmente serão as mais afetadas. As das áreas rurais provavelmente não serão muito afetadas porque o status residencial rural já permite que os casais tenham mais que um filho. Mas nas cidades, onde o abastecimento da China para a sociedade é insuficiente, a licença maternidade e necessidade por creches são mais sentidas, a geração de mulheres com maiores níveis de educação vivendo nas cidades podem começar a perder suas carreiras competitivas e suas promoções.
E se as famílias tiverem um menino e uma menina, é provável que as famílias invistam mais na educação e nas aspirações do garoto: a China ainda é uma sociedade patriarcal com preferência pelos filhos. A igualdade de gêneros que ocorreu nas famílias urbanas durante a geração de um filho só pode estar prestes a acabar.
*Ye Liu é palestrante sênior em Educação Internacional da Universidade Bath Spa, na Inglaterra. Esse artigo foi publicado originalmente em inglês no The Conversation.
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