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quinta-feira, 7 de julho de 2016

Vítima vive via-crúcis e falta de estrutura após estupro

07/06/2016  15:25
Capítulo 1

ANDRÉ MONTEIRO 
ANGELA BOLDRINI 
EDUARDO GERAQUE 
EMILIO SANT'ANNA 
FABRÍCIO LOBEL 
ROGÉRIO PAGNAN 
DE SÃO PAULO
A maior parte dos casos de violência sexual no país nunca chegará a ser investigada. A estimativa é que sejam mais de 500 mil por ano. O retrato dos cerca de 50 mil registros que chegam até a polícia assusta –como o estupro coletivo da adolescente de 16 anos em uma favela do Rio e dois casos semelhantes em um ano no Piauí. O que se segue às denúncias também.
Delegacias de Defesa da Mulher que funcionam apenas em "horário comercial", descaso e constrangimentos durante o atendimento e falta de estrutura para examinar as vítimas. Problemas que se acumulam, reforçam a descrença na Justiça e parecem realimentar um sistema que não fica sabendo, não investiga e não pune os agressores.
"Por que as mulheres tendem ao silêncio? Vergonha, medo, sentimento de culpa, descrédito na Justiça e medo de exposição, que chamamos de revitimização", diz a promotora Valéria Diez Scarance Fernandes, coordenadora do Núcleo de Gênero do Ministério Público de São Paulo.
Para ela, é o que ocorre agora com a adolescente vítima de estupro coletivo no Rio. O crime ocorreu em 21 de maio, no complexo de favelas São José Operário, zona oeste, mas só se tornou público três dias depois, quando um vídeo de 38 segundos foi publicado em redes sociais.
Nele, ao menos três homens estão em um quarto com a adolescente desacordada e um toca nas partes íntimas da garota dizendo que ela foi violentada por "mais de 30".
Oito dias depois, após surgirem uma série de críticas sobre a forma "machista" com que a vítima era tratada pela polícia, o delegado Alessandro Thiers, titular da DRCI (Delegacia de Repressão a Crimes de Informática), foi afastado das investigações. Antes havia sugerido que o exame na garota iria contradizer a versão do estupro.
Situações assim não são raras. Uma série de reclamações na Ouvidoria da Polícia Civil de São Paulo mostram isso. Entre elas constam ainda a dificuldade em se registrar um B.O., o descrédito dado às vítimas e a lentidão das investigações.
Os problemas não param por aí. Em São Paulo, nenhum dos dez distritos campeões de registros de estupro de 2015, possui Delegacia da Mulher.
Isso significa que a maioria das vítimas de regiões como Capão Redondo, Itaim Paulista (zona leste) e Jardim das Imbuias (zona sul) não foi atendida em unidades com estrutura especial para esses casos.
Estrutura que também falta durante a realização de exames, principalmente no interior do Estado. Segundo relatório do governo Alckmin (PSDB), há casos em que as mulheres são submetidas ao uso de equipamentos improvisados, como lanternas compradas de camelôs, para a coleta de provas ginecológicas.
O sofrimento dessas mulheres vai se estender durante as investigações. Segundo especialistas, a lógica mais usada nessa fase, que é a de procurar reconstituir um episódio, costuma mudar quando o crime é um estupro.
O que é feito, mostra estudo da socióloga Daniella Coulouris, é a reconstrução social dos indivíduos -o que tem peso decisivo na absolvição ou condenação dos acusados. Em uma de suas pesquisas, a especialista analisou 83 processos. Em apenas dezenove, houve condenação aos agressores.

A VIA-CRÚCIS DA VÍTIMA DE ESTUPRO
Falta de estrutura, mau atendimento e impunidade estão no caminho de quem quer denunciar o crime
      
NOTIFICAÇÃO
Estima-se que apenas uma em cada 10 vítimas denunciem o crime à polícia. Um dos motivos é o medo de represálias, já que 70% dos agressores são do convívio da vítima
      
DELEGACIA
A vítima pode ter dificuldade para achar uma DDM (Delegacia de Defesa da Mulher). Das nove delegacias do tipo na cidade de SP, nenhuma funciona 24h ou está nos 10 bairros com maior registro de estupro
      
ATENDIMENTO
Mesmo nas DDMs, o tratamento não costuma ser adequado. Há queixas de vítimas que foram constrangidas ou tiveram seus relatos desacreditados
      
EXAMES
Falta estrutura nos IMLs (Institutos Médicos Legais) para fazer os exames nas vítimas. Há salas e mesas inadequadas e equipamentos improvisados, e a maior parte dos prédios não tem autorização sanitária para funcionar
      
INVESTIGAÇÃO
Pouca estrutura policial e dificuldade para colher provas são barreiras aos inquéritos. No Estado de SP, apenas 2 em cada 10 inquéritos abertos pela Polícia são esclarecidos
      
JUSTIÇA
Estudo aponta que, dos poucos casos que chegam à Justiça, a maioria acaba em absolvição

MARCAS
Do total das vítimas: 23% sofrem de estresse pós-traumático; 11% têm transtorno de comportamento; 7% ficam grávidas*
527 mil tentativas ou casos de estupro consumado anualmente no país*
89% das vítimas são do sexo feminino; elas possuem, em geral, baixa escolaridade*
70% são crianças e adolescentes —50% delas são reincidentes*
*Dados de 2013 do Ipea Fontes: Ipea, Secretaria de Segurança Pública de SP e Ouvidoria da polícia

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