DW
16.06.2018
Claudia Neumann é a primeira mulher da história da televisão alemã a narrar uma Copa do Mundo. Em entrevista à DW Brasil, jornalista fala sobre machismo e seu papel no debate sobre sexismo.
16.06.2018
Claudia Neumann é a primeira mulher da história da televisão alemã a narrar uma Copa do Mundo. Em entrevista à DW Brasil, jornalista fala sobre machismo e seu papel no debate sobre sexismo.
Pela primeira vez na história da televisão alemã, uma mulher narrará jogos masculinos da Copa do Mundo. A selecionada para acompanhar o Mundial na Rússia foi a pioneira Claudia Neumann, da emissora pública ZDF, um dos dois principais canais abertos a transmitir o evento no país.
Neumann ingressou na cobertura esportiva em 1992 e, em 2011, se tornou a primeira mulher a narrar partidas de futebol na televisão alemã. Os primeiros jogos foram no Mundial de futebol feminino, sediado na Alemanha. Cinco anos depois, começou a participar de transmissões de futebol masculino.
Sempre que narra partidas de homens, como a deste sábado entre Islândia e Argentina, Neumann é alvo de críticas e insultos nas mídias sociais, na maioria das vezes em tom sexista. Em entrevista à DW, a narradora, que fará pelo menos outros três jogos no Mundial, diz que não se importa com os comentários maldosos e comenta a posição da mulher na cobertura esportiva.
DW Brasil: Neste ano, você vai narra pela primeira vez uma Copa do Mundo, algo que nunca uma mulher fez na Alemanha. Como você recebeu o convite?
Claudia Neumann: Essa história de entrar para história é mais um tema da mídia. Para mim, isso não é nenhum um pouco importante. Sinto-me bem e me divirto com meu trabalho. Estou apenas fazendo meu trabalho e me sinto como qualquer colega homem que, assim como eu, cresceu com o futebol. Não me sinto diferente dos meus colegas homens.
No Brasil, atualmente há uma campanha contra assédio a jornalistas que cobrem esporte no âmbito de trabalho, a campanha "Deixa ela trabalhar". Como é na Alemanha ser mulher trabalhando na cobertura esportiva, principalmente do futebol, uma modalidade na qual o machismo ainda é muito presente?
No Brasil, atualmente há uma campanha contra assédio a jornalistas que cobrem esporte no âmbito de trabalho, a campanha "Deixa ela trabalhar". Como é na Alemanha ser mulher trabalhando na cobertura esportiva, principalmente do futebol, uma modalidade na qual o machismo ainda é muito presente?
Eu nunca passei por essas situações e também não conheço nenhuma colega que passou por isso. Mas é claro que não dá para dizer que não existe. É preciso, porém, ter cuidado para não superdimensionar tudo. Sou muito cuidadosa com generalizações. Nunca sofri assédio no trabalho, e acho que isso tem também um pouco relação com o comportamento no local de trabalho. Nunca me defini como mulher no trabalho, mas sim com o que eu faço.
Você acredita que é mais cobrada do que seus colegas homens por ser mulher?
Não no trabalho. No meu caso, sou vista de maneira diferente pelo público. Há um olhar e um ouvido mais atento, pois há um pouco mais de ceticismo. Isso, porém, tem a ver com pessoas que têm uma imagem que não é muito moderna. O melhor exemplo é quando um narrador se confunde: se for uma mulher é incompetência, se for homem é apenas confusão. Mas não se deve levar isso tão a sério.
Na sua opinião, quando as mulheres terão o mesmo espaço que homens na cobertura esportiva?
A quantidade é uma questão de tempo. Há 20, 25 anos as mulheres quase não se interessavam por esporte. Antigamente, meninos jogavam futebol, e meninas, não. Então, por que agora mais mulheres devem trabalhar com futebol? Essa conta não pode funcionar. Isso vai se ajustar lentamente no decorrer dos anos. Atualmente, mais mulheres jogam futebol. Assim, futuramente, elas terão uma vida anterior com o futebol e a devida competência, o que se refletirá nos próximos anos num aumento quantitativo nas redações esportivas. A atual relação desigual não é uma surpresa e tem a ver com o passado e os papéis tradicionais de antigamente.
Como é possível mudar essa relação desigual?
Isso não pode ser mudado de prontidão e é um fenômeno social que ocorre também em outros setores. O bom é que em muitos setores da sociedade as pessoas estão colocando o dedo nesta ferida. Na cobertura esportiva, isso deve ser mudando com bons chefes, que incentivam e apoiam mulheres, mas não com cotas.
Por que você é contra cotas?
Não é bom favorecer alguém só porque é mulher. Pode acontecer que o mais experiente seja prejudicado, e isso pode não acabar bem. Não é bom para o desenvolvimento de uma mulher ter a sensação de que foi favorecida por ser mulher. Também não é bom para o clima da redação. O princípio do mérito profissional deve ser seguido. Mulheres que têm talento, vontade e que os chefes acreditam que têm futuro devem ser incentivadas e encorajadas.
Você costuma ser questionada com frequência sobre mulheres na cobertura esportiva e machismo no futebol. Você se sente incomodada com essas perguntas?
Há dois anos na Eurocopa, entendi que esse era um papel que deveria assumir para incentivar colegas mais jovens a ter coragem de seguir nesse caminho. Confesso, que pessoalmente não gosto muito de estar no centro das atenções e deste tema. Mas é certa responsabilidade social que sinto neste momento. Trabalho há anos nesta profissão e provavelmente sou uma pioneira. Sinto a responsabilidade de trazer leveza ao debate e mostrar para as pessoas que não é preciso ter medo quando a internet se enfurece.
Quais seleções são as suas favoritas para a conquista do título?
Para mim, as quatro seleções mais fortes são Alemanha, Brasil, França e Espanha.
Qual é a sua aposta para campeão da Copa 2018?
A Alemanha, apesar de o Brasil ter uma seleção forte. Precisamos ver o que eles conseguem coletivamente e se já superaram completamente o 7 a 1.
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