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terça-feira, 14 de maio de 2019

Algumas de nós decidimos não ser mães


Día de las madres
Uma mãe com a filha, no México.  CUARTOSCURO


Foi Dia das Mães no meu país, e eu sou uma dessas que decidiu não ter filhos. Há muitos anos, nem sequer me lembro se houve alguma epifania. Apenas foi acontecendo. E bem, pensará em mais de uma pessoa, que cada um faça de seu corpo o que bem entender.

Por que deveria ser um assunto público?
Não deveria, mas se torna público quando você altera lógicas de conservação do estado das coisas.
10 de maio é o Dia das Mães no México. Se você, querida leitora ou querido leitor, não viveram nesta terrinha, deveriam fazê-lo algum dia. É quase um esporte radical. Todo 10 de maio, seja qual for o dia da semana, o país fica paralisado a partir do meio-dia. Nós, mexicanos, somos muito carinhosos, mas pela mãe sentimos devoção. Restaurantes lotados, comércio apoteótico, publicidade delirante. No dia 10 de maio, a mamãezinha é festejada em grande estilo, porque não ter mãe, nessas terras, não significa apenas uma possível ausência biológica real, mas também descreve uma doença essencial de caráter. Aquele que não tem mãe, nesta segunda acepção, não é alguém confiável e arranha o sobrenome para além de qualquer mínima virtude. Traduza-se tudo isto em tequilas, mariachis e explosões de sentimentos e você terá no 10 de maio uma amostra clara de por que no México o insulto de “não ter mãe” é acompanhado pelo correlato carinhoso de eres a toda madre (você é uma pessoa esplêndida). Só a mãe permite neste país que coexistam os que se odeiam com os chatos e com aqueles que só estão de passagem, mas estão necessitados de pertencimento. Ou algo assim.
Um pouco herança espanhola, um tanto narrativa originária e um muito nossa vocação para o melodrama. Ou seja o que for, isso não é uma ciência exata. Coco imortalizou a força do chinelo materno e o presidente Andrés Manuel López Obrador enalteceu as mães de família como as que podem controlar os impulsos criminosos dos bandidos. Porque mãe só existe uma.
Embora o México seja maior do que seus estereótipos.
Eu, como lhes dizia, desde sempre decidi que não teria filhos. Não foi um momento dramático ou uma determinação biológica. Simplesmente decidi que não, embora tal decisão me colocasse no fio da sentença daquela fulana que, com o olhar ao longe, abençoa como única a condição feminina de ser mãe. Uma mulher decide não ter filhos. E pronto. Não acontece nada. Mesmo que a fulana fique incomodada.
Por que deveria ser um assunto público?
Não deveria, mas se torna público quando você altera narrativas dominantes. Por isso, sugiro festejar as mães no plural: as que são por vocação ou por decisão, as que são apesar de tudo, as que são por adoção, as que são porque lhes coube. Comemorar desde as mães que diariamente procuram por seus desaparecidos, entre escombros e sob o sol, arranhando e rasgando a terra. Mães que cuidam de seus filhos e dos filhos alheios. Mães que ficaram sozinhas e aquelas que são abraçadas por uma ampla rede de apoio. Mães que decidem continuar trabalhando e que ficam com o coração partido por deixarem os pequenos que mal brotam em suas demandas afetivas. Que às vezes são as mesmas. Mães que procuram formar gerações mais solidárias. E sim, mães que não querem sê-lo e aquelas que se arrependeram. O drama humano é amplo e diverso, o coração deve sê-lo também.
Queremos entender como as sociedades se transformam? Olhemos como evolui o conceito de maternidade e sua concretização. E revejamos quais estereótipos temos de desconstruir.
Agora, se vocês estiverem por estas terras, os convido para uma tequila. Pois mãe só existe uma. E se não existir, nós inventamos. E se não o fomos, o abraçamos. Porque dizem que no México somos, uns mais e outros menos, a toda madre.

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