por Ana Cássia Maturano*
A mãe de uma garotinha de três anos está preocupada porque ela começou a ter medo do Bicho Papão. O medo é tanto que a menina não quer mais dormir em seu quarto. Como em casa ninguém fala desta figura, a mãe imaginou que a pequena a conheceu na escola.
Dito e feito. Segundo a professora, durante a aula de música foi passado um vídeo sobre o Bicho Papão, por ser o mês do folclore. Mas as coisas não pararam por aí. A garotinha relatou que a professora disse que o tal bicho irá pegá-la caso faça xixi na calça. Diante disto, a mãe ficou em dúvida sobre se deve ou não falar com a coordenadora e se é adequado trabalhar o folclore com as crianças.
Para alguns, essas questões podem parecer uma bobagem. Ora, qual o problema com o Bicho Papão? É só uma brincadeira? Talvez para um adulto. Não para alguém de três anos.
Com esta idade, o pensamento é impregnado de fantasias, quando real e imaginário se confundem – se a professora disse que tal personagem existe, ele existe mesmo. À medida que a criança cresce e se desenvolve, consegue perceber mais claramente o que o que é fantasia e o que não é. Por exemplo, elas acreditam em Papai Noel. Lá pelos seis anos, um pouco menos ou um pouco mais, deixam de acreditar.
Não tem problema algum. Porém, algumas dessas figuras são assustadoras, como o Bicho Papão. Por isso, ao falar sobre ele, é necessário que seja garantido à criança tão pequena que tal personagem não existe, que é apenas uma história, sem exagerar em suas características assustadoras. Caso contrário, ela terá chance de ter medo. O Saci é uma figura muito apreciada pelos pequenos. Eles tendem a se identificar com ele, que é um menino travesso.
Se o personagem é usado como ameaça de punição, aí sim o medo pode se instalar. Isso jamais deve ser feito. De um perigo real é fácil nos protegermos. Mas de um que ninguém nunca viu… É bem mais difícil.
O folclore em si é uma riqueza, deve sim ser ensinado, faz parte de nossa cultura. É necessário, porém, cuidar da maneira como é trabalhado.
Sobre a professora usar o medo como controle de comportamento, ainda mais numa situação de aprendizagem tão importante como o uso do banheiro, é algo que sem dúvida deve ser discutido com a escola. Não é algo adequado de se fazer.
As crianças já têm tantos medos, tantas incompreensões sobre o mundo, que não devemos criar mais angústias.
*Psicóloga e psicopedagoga formada pela Universidade de São Paulo (USP), é especialista em problemas de aprendizagem e escreve sobre educação e a relação entre pais e filhos.
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