Por: Alice Marie*
Em toda nossa formação escolar, acadêmica e cultural, aprendemos que foram sempre os homens, o sexo masculino, que construiu, passo a passo e com muita bravura, a nossa História. Todas as ciências, saberes científicos, como disciplinas acadêmicas, sempre nos foram passadas, muito naturalmente, com o viés masculino, sem dar margem para dúvidas e questionamento. Ou seja, nos foi passada uma Verdade em forma de Paradigma, este chamado de Patriarcalismo.
No fundo, o que levamos com toda essa formação de anos e anos passados na creche, escola e universidade, é que foram os homens que construíram tudo o que temos até aqui, toda a ciência e tecnologia, toda a filosofia, enfim, tudo graças ao sexo “forte”, tudo graças aos “Pais” – o grandepater familiae Romano, centro de todo o Direito e Política. Esses foram os grandes chefes, reis, parlamentares/presidentes, comandantes do exército. Glória a eles!
Tudo nos passa desapercebido, naturalizado, até o momento em que percebemos que todas as bases que tínhamos de “verdade” são um tremendo equívoco. Descobrimos que quem fazia as pinturas rupestres, há milhares de anos atrás, deixando sua realidade e história humana eternizadas no planeta, foram nada mais, nada menos do que as Mulheres.
Ué, mas quem são essas figuras que quase não apareceram até então? E por sermos figuras tão pouco representadas nos cargos de liderança das funções produtivas, isso é, exercidas no espaço público, nós, enquanto sociedade, tendemos a rebaixar a sua relevância!! Que tal contarmos um pouco de sua história? Pode ser que seja importante!
Nós, mulheres, erguemos o mundo nas nossas costas e não tivemos a representatividade que merecíamos. A história foi deturpada em favor de um sexo específico. Alguém, lá atrás, em algum momento, formulou um conceito: pensou que a mulher era o sexo “frágil”, e isso resultou no que sabemos: em papéis rígidos de gênero, em preconceito e alienação.
Fomos tiradas da história à força. E a consequência, caras(os) amigas(os), é que até agora temos uma dificuldade tremenda de nos enxergar agentes desse mundo e possíveis portadoras de uma realidade distinta. Vivemos, em pleno século XXI, a alienação da nossa condição e a dificuldade de sairmos de um paradigma insano e excludente, patriarcal, antropocêntrico, insensível, capitalista.
Esse paradigma, não se enganem, foi e é cruel com a natureza, com as mulheres e com os homens, retirando de nossa essência a compaixão, a solidariedade, a sensibilidade, a harmonia e a sintonia com a natureza, e nos deixando o que resta de pior: a caixa de Pandora do egoísmo, do etnocentrismo e do ódio.
Caras senhoras e senhores, já venceu o prazo desse paradigma encoberto e embasado no patriarcalismo. Chega de guerras e ódio conduzidos por homens, chega de autoritarismo, chega depater familiae com sua voz única, chega de ensino unidirecional e deturpado.
Esse é o momento de construção de uma nova forma de enxergar o mundo. Momento de um mundo mais colorido, mais plural e feminino, humano e sensível, já dizia Mário de Andrade em seu conto – O Peru de Natal – em que ele dá a voz à sua mãe, às mulheres, a um mundo onde as relações possam ser vistas para além da brutalidade, do jogo de soma zero que as taxas de lucro e o egoísmo alcançam.
O que é o feminismo, então, e por que ele é importante? O feminismo é um novo paradigma à nossa frente. Feminismo é libertação, tanto feminina quanto masculina. Ao contrário do que muitos pensam, não é ditadura feminina (como é o patriarcalismo a ditadura masculina), ou seja, não é domínio da mulher sobre o homem e muito menos é repressão e exclusão do sexo masculino.
Feminismo é o olhar sensível para as nossas ações no planeta. É o olhar ético de respeito e compreensão mútuos. É a reflexão sobre desigualdade – em todos os aspectos da vida –, sobre a construção e a permanência de papéis sociais de gênero numa relação de assimetria. É uma forma de combater a mercantilização dos corpos submetidos a essa relação desigual. É uma nova construção sobre liberdade, pois acreditamos que devemos ser livres para que possamos ser o que quisermos, e por exemplo nos vestir como quisermos, pois o respeito que os outros têm em relação a nós não deve estar baseada na nossa etnia, aparência, estética, renda ou posição social, e sim na nossa humanidade, na maneira como nos relacionamos com as outras pessoas e com a natureza.
Feminismo, também, é discutir sobre estética, sobre padrões de beleza que recaem cruelmente em ambos os sexos, e inclusive cada vez mais no sexo masculino. É discutir sobre nosso papel na História, os papéis que tivemos e que teremos, é discutir nosso papel nos espaços sociais e de que forma nossa imagem é difundida e estereotipada. Feminismo é trazer a Mulher, especificamente, para a causa feminina, para a percepção de sua condição. É o despertar, que nos faz mais solidárias umas com as outras, que cria nosso empoderamento e promove o nosso reconhecimento na sociedade mais justa que estamos construindo.
* Alice Marie é militante do coletivo Rosa dos Ventos, núcleo da Marcha Mundial das Mulheres no Rio de Janeiro, e estudante de Direito.
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