Como lidar
com a culpa materna
Giuliana Bergamo
Getty Images
Você se sente culpada em relação aos
filhos? Saiba que não está sozinha. O sentimento é comum a todas as mães
zelosas, mas é possível, sim, conviver com ele de forma saudável
O nascimento do bebê desperta o
instinto maternal e, com ele, vem a... culpa! Esse sentimento incômodo não
deixa incólume nem as mulheres que se dedicam 24 horas aos seus rebentos. “Meu
filho está muito apegado, será que sou presente demais?”, questionam. A coisa
só piora quando elas têm de se dividir entre casa e trabalho. “Sou muito
egoísta porque penso em carreira enquanto meu bebê precisa de mim”, punem-se.
Se entram na equação lazer, hobbies e outros interesses pessoais, então, a
coisa fica feia. E vem o exagero: “Sou uma péssima mãe porque deixo meu filho
uma vez por mês com a avó para almoçar com minhas amigas.” O fato de esse
mal-estar ser comum a todas as mulheres que têm filhos não significa, porém,
que um esforço para controlar a culpa seja desnecessário ou em vão. Pelo
contrário. É possível, sim, viver a maternidade de maneira mais tranquila. E um
dos primeiros passos é identificar as origens de tanta culpa.
A mais antiga delas vem do que os
psicanalistas costumam chamar de “herança intergeracional”, ou seja, a ideia
para lá de caduca de que mulheres nasceram para serem mães e cuidarem da casa,
da família. Só isso. Uma bobagem tremenda, mas que persiste no subconsciente
feminino. Em geral, é por causa dela que você se pega questionando se o emprego
não está ocupando lugar demais em sua vida mesmo que tenha feito a opção de
trabalhar meio período para poder se dedicar ao bebê. É essa noção de que as
mulheres nasceram exclusivamente para a maternidade também que incomoda quando
você decide deixar os filhos com a babá para sair com o maridão, ou quando
resolve ler um livro em vez de arrumar o material escolar das crianças.
E não para por aí. “Outra grande
fonte de culpa é uma fantasia onipotente, a ideia de que é possível dar conta
de tudo e com perfeição”, afirma a especialista em psicopatologia do bebê,
Maria Cecília Pereira da Silva, membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise
de São Paulo. Funciona mais ou menos assim: em 24 horas, você tem que ser
sensível aos sinais de desamparo do seu filho, garantir que a empregada e a
babá atendam a todos os seus comandos, manter o mesmo ritmo de produção no
trabalho que tinha quando era solteira (ou ainda aumentar), estar linda e sexy,
namorar, dormir oito horas e acordar animadona para correr na esteira. Ou: já
que decidiu dar um tempo na carreira para cuidar da cria, vai ter que amamentar
até os dois anos, no mínimo, cozinhar todas as refeições dos seus filhos com
ingredientes orgânicos escolhidos a dedo por você mesma, construir brinquedos
artesanais, contar histórias interessantíssimas que inventou, colocar o bebê
para dormir todas as noites e por aí vai... “As mulheres estão adoecendo com
suas expectativas de perfeição”, escreveu Karen Kleiman, fundadora e diretora
executiva do Centro de Stress Pós-parto dos Estados Unidos no artigo Guilty,
Mothernhood and the Pursuit of Perfection (Culpa, Maternidade e a Busca pela
Perfeição, em português).
Está claro que, na maioria dos casos,
a culpa é parte de uma armadilha que criamos para nós mesmos. Mas tal sentimento
também tem uma função benéfica. Ele serve de norte para nos ajudar a avaliar se
estamos agindo da forma que julgamos correta. “A culpa é uma expressão de
maturidade psíquica, emocional”, diz a psicanalista Belinda Mandelbaum,
coordenadora do Laboratório de Estudos da Família do departamento de Psicologia
Social e do Trabalho da USP. “Ela é sinal de que somos responsáveis por aquilo
que fazemos com o outro.” Ou seja, a culpa faz parte da vida de quem zela pelos
filhos. Uma atitude saudável, portanto, é usar o sentimento como um instrumento
diário de aperfeiçoamento da vida em família. Ao menor sinal de culpa, pare,
avalie a situação e deixe o instinto agir.
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