Por BaherKamal, da IPS –
Roma, Itália, 19/5/2016 – “O sofrimento humano causado por conflitos armados e desastres alcançou níveis assombrosos”, afirmou o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, ao explicar o motivo da realização da primeira Cúpula Humanitária Mundial (CHM), nos dias 23 e 24 deste mês, em Istambul, na Turquia. Quase 60 milhões de pessoas, metade delas meninos e meninas, foram obrigadas a abandonar suas casas devido aos conflitos e à violência, destacou.
“O custo humano e econômico dos desastres causados por fenômenos naturais também aumenta. Nas últimas duas décadas, 218 milhões de pessoas ao ano foram afetadas pelos desastres, a um custo anual para a economia global que já supera os US$ 300 bilhões” acrescentou Ban.Especialistas e altos funcionários da ONU qualificaram a situação atual como “a pior crise humanitária mundial desde a Segunda Guerra Mundial”.
Como enfrentar este desafio sem precedentes será a tarefa dos aproximadamente seis mil delegados que participarão da Cúpula Humanitária Mundial. “Toda crise humanitária é intrinsecamente singular e específica segundo seu contexto”, explicou à IPS o político e diplomata britânico, nascido na Tanzânia, Stephen O’Brien, que desde março deste ano é subsecretário-geral da ONU para Assuntos Humanitários.
“Há 125 milhões de pessoas com necessidade de ajuda no mundo hoje em dia, devido aos conflitos e desastres naturais, e mais de 60 milhões de pessoas foram deslocadas pela força. São os números mais altos registrados desde a Segundo Guerra Mundial”, afirmou O’Brien, responsável pelo Escritório para a Coordenação de Assuntos Humanitários (Ocha).
Para O’Brien, é evidente que o cenário da ação humanitária mudou consideravelmente nos últimos anos, e que “coletivamente não somos capazes de nos manter em dia de maneira adequada e de responder aos desafios contemporâneos”. Não se trata de uma crise humanitária, mas de numerosas crises simultâneas, como a da Síria e região, e as consequências do fenômeno climático El Niño, que atualmente afetam 60 milhões de pessoas no mundo, apontou.
O’Brien alertou que as necessidades humanitárias cresceram de maneira exponencial, mas os recursos não, o que gerou uma brecha cada vez maior.O subsecretário-geral assegura que a CHM é uma oportunidade única para manter o impulso a favor da mudança, gerada durante mais de três anos de consultas com os protagonistas em todo o mundo, e para enviar uma mensagem de solidariedade e apoio aos milhões de pessoas que precisam de ajuda.
“Esperamos que os líderes mundiais assumam compromissos essenciais para atuar de maneira significativa na prevenção, prepararão e mitigação das consequências dos conflitos, desastres naturais, do deslocamento e de outras causas de necessidade, e avancem em questões como financiamento suficiente e oportuno do trabalho humanitário”, afirmou O’Brien.
Para o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), as consequências da mudança climática são “enormes”. Recursos naturais escassos, como a água potável, podem chegar a ser ainda mais limitados, segundo esta agência.Muitos cultivos e o gado terão poucas probabilidades de sobrevivência em alguns lugares se o clima se tornar excessivamente quente e seco, ou demasiadamente frio e úmido. A segurança alimentar, que já é uma preocupação para muitos, será um problema ainda maior.
Informes recentes mencionados pelo Acnur indicam que 22 milhões de pessoas foram deslocadas em 2013 em razão de causas naturais. E, como em anos anteriores, a região mais afetada foi a Ásia, onde 19 milhões, ou 87,1% do total mundial, foram deslocados durante o ano.
As pessoas terão que tentar se adaptar a essa situação, mas para muitos isso significará um movimento consciente rumo a outro lugar para sobreviver. Esses deslocamentos, ou as repercussões adversas que a mudança climática teria sobre os recursos naturais, desatariam conflitos com outras comunidades, já que cada vez mais pessoas competem por recursos cada vez em menor quantidade, segundo o Acnur.
A IPS consultou O’Brien sobre esse fenômeno e o número previsto de refugiados climáticos no futuro próximo. A resposta foi que “o informe Uma Humanidade: Nossa Responsabilidade Compartilhada, do secretário-geral da ONU, destaca o aumento do risco de desastres impulsionado pela mudança climática. Como demonstram as crises anteriores, cada uma é diferente, imprevisível e específica em seu contexto e pode provocar o deslocamento e o aumento da migração. Entretanto, o Ocha não está em condições de especular ou fornecer estimativas sobre um cenário hipotético”.
O que fica claro “é a necessidade de se romper os compartimentos existentes para trabalho em colaboração, prever em lugar de esperar que as crises aconteçam, transcender a divisão desenvolvimento-humanitário, para atuar por resultados coletivos, investir mais em risco e aproveitar a tecnologia disponível e as melhores práticas”, ressaltou O’Brien.
A IPS perguntou ao subsecretário-geral da ONU se espera que a partir da cúpula de Istambul sejam implantadas de maneira efetiva e imediata as decisões e recomendações que dela surgirem.A resposta foi que “um objetivo central da cúpula é a revitalização da vontade política e do compromisso de aplicar a Agenda para a Humanidade. A CHM é uma plataforma de lançamento ao nível mais alto, porém, o mais importante será o compromisso de acompanhamento e de realizar estas ações”.
Será pedido aos Estados membros da ONU e a outros atores que informem sobre a aplicação dos compromissos assumidos na cúpula de Istambul. “O acompanhamento em nível intergovernamental começará com o segmento de Assuntos Humanitários do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas”, explicou O’Brien.O informe que Ban Ki-moon entregará à Assembleia Geral tratará sobre como serão implantadas cada uma das responsabilidades fundamentais e também definirá os instrumentos para avaliar o progresso, acrescentou.
“O financiamento humanitário existente geralmente toma a forma de subvenções de curto prazo, inclusive quando as respostas continuam durante anos e anos. Isso pode dar lugar à fragmentação entre todos os atores e, especificamente, pode incentivar os agentes humanitários e de desenvolvimento a operarem de forma isolada”, disse O’Brien.
Para o subsecretário-geral, “está claro que as estruturas financeiras incoerentes e inflexíveis, que não são nem equitativas nem baseadas na análise do risco, são prejudicais à consecução de resultados de longo prazo. Em primeira instância, o investimento na humanidade, naturalmente, deve ser aumentado”.
“Entretanto, o objetivo também é que todos os atores se comprometam a financiar resultados coletivos em lugar de projetos individuais, e de fazer isso de modo que seja flexível, ágil e previsível ao longo de vários anos, para que os atores possam planejar e trabalhar de maneira sustentável e se adaptar às mudanças nos níveis de risco e de necessidades em um contexto particular”, acrescentou O’Brien.
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