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terça-feira, 31 de maio de 2016

Engenheira cria plataforma para organizações sociais

Projeto é voltado a questões de gestão,
processos e desempenhos de sistemas cooperativos



Em tese desenvolvida junto à Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp, orientada pelo professor Orlando Fontes Lima Junior, Christiane Lima Barbosa, com graduação e mestrado em engenharia civil pela Universidade Federal do Pará (UFPA), estrutura uma proposta de caracterização de uma plataforma logística destinada a organizações sociais ou de economia solidária, como são mais conhecidas no Brasil, que envolvem o sistema cooperativo. Diferentemente das plataformas computacionais, a proposta do trabalho é a utilização de uma plataforma que visa a atender questões de gestão, processos e desempenhos de organizações de cunho social, caso das cooperativas, em geral ligadas a atividades familiares relacionadas ao extrativismo, como pesca, artesanato, manufaturas e produtos diversos do setor agropecuário.
No trabalho que culminaria na “Caracterização de plataforma logística para organizações sociais”, a pesquisadora se propôs a verificar inicialmente como uma plataforma logística pode contribuir para a melhora do desempenho sustentável das organizações sociais de forma a garantir-lhes a permanência no mercado. Mesmo porque essas organizações enfrentam o desafio de orientar suas ações no longo prazo em consonância com os aspectos econômicos, processos e clientes. Para tanto, elas necessitam manter uma evolução contínua em direção ao progresso organizacional quanto às finanças, clientes, procedimentos internos, crescimento, aprendizagem, formação de parcerias e preservação do meio ambiente.
O próprio título do trabalho faz referência a dois aspectos que merecem ser esclarecidos: os logísticos – que envolvem transporte, informação, produção, comercialização e meio ambiente; e o de economia social – um modelo encontrado por pequenas comunidades, menos favorecidas social e economicamente, para promover renda com o intuito de melhorar a qualidade de vida. Essas melhoras consolidam-se através de cooperativas ou associações, públicas ou privadas, que reúnem certo número de cooperados ou associados.
Estudos de casos
Embora já desde o início a pesquisa tivesse o objetivo de caracterizar uma plataforma logística que incluísse critérios ambientais e sociais, segundo a pesquisadora, o start que a ajudou a limitar o escopo da pesquisa e determinou sua orientação surgiu por ocasião de sua participação no Projeto Rondon. Foi a partir do envolvimento nesse trabalho que ela se decidiu pelos estudos de casos prospectivos nas regiões Norte, Nordeste e Sul do Brasil, selecionados por envolverem diversificados segmentos econômicos, apresentarem diferentes níveis de maturidade e estratégias logísticas, mas semelhantes no sistema de gestão em cooperativas, o que lhe permitiria definir uma caracterização de plataforma calcada em observações práticas.
“A participação no Projeto Rondon me ajudou a refinar a abordagem porque senti a necessidade de conhecer como cooperativas ou associações se organizam, que atividades desenvolvem, que tipo de transportes utilizam, como o meio ambiente as influenciam e, tratando-se de atividades familiares, como ocorre a transmissão do conhecimento. Essas observações me levaram a estabelecer o conceito de plataforma logística social, estruturada segundo três grandes vetores: a gestão, o processo e o desempenho”, afirmou a pesquisadora.
Em decorrência do Projeto Rondon, o seu primeiro estudo de caso envolveu a atividade pesqueira artesanal em Apicum-açú, um dos principais polos pesqueiros do Estado do Maranhão. Neste caso, a motivação inicial da pesquisadora foi a de estudar como o transporte e a logística poderiam ajudar os pequenos produtores. Ela realizou, então, um levantamento das principais atividades econômicas da região e suas relações com as questões ambientais e sociais.
Descobriu que os produtos desse centro pesqueiro se destinam principalmente às capitais São Luís, Fortaleza e Belém, em que chegam principalmente por via rodoviária, embora pudessem também ser utilizadas as vias fluviais e marítimas. Os pescadores são financiados por intermediários que estabelecem o preço da compra do pescado e definem o seu valor de venda. Como as distâncias aos centros consumidores são grandes, por deficiência de transporte, parte do produto se deteriora e o descarte compromete o meio ambiente.
O desafio dessa região é a melhoria da produção e do compartilhamento do transporte, a garantia da qualidade do produto, a conscientização de melhores práticas logísticas e de gestão, o desenvolvimento de tecnologias e de novos processos para o beneficiamento do pescado, agregando-lhe valor.
O segundo estudo de caso aborda a produção cerâmica marajoara de Icoaraci, distrito da região metropolitana de Belém do Pará. Como a cooperativa local deixou de existir, cada produtor comercializa por conta própria. Trata-se de outra realidade. Enquanto Apicum-açú possui uma gestão que pode ser melhorada e ampliada com vistas a novos mercados, Icoaraci se ressente de uma infraestrutura viária e de transportes que facilite o acesso das olarias aos centros de comércio regional e, principalmente, da abertura de novos mercados, pois a comercialização é praticamente local.  Há o benefício da proximidade dos insumos minerais (a argila) utilizados na confecção de peças utilitárias em cerâmica e o diferencial do valor agregado, que resulta da criação de peças com design e decorações que refletem a cultura da região.
O terceiro estudo de caso envolveu artesanato e centrou-se em uma das principais cooperativas da cidade de Belém, Pará. Seus artesãos comercializam peças com materiais típicos da Amazônia como bolsas de juta e couro, camisas regionais, brincos, pulseiras e colares de sementes, madeira, fibras, madrepérolas, porta joias, sabonetes, velas perfumadas, sandálias em couro, cerâmicas e os tradicionais cheiros do Pará. Além de cada cooperado oferecer um produto diferente, eles próprios procuram parcerias que os levam até a vender em redes de shoppings. Esses diferenciais abriram novos mercados, ampliaram clientes e rede de colaboradores, contribuindo para o desenvolvimento de cooperados e parceiros.
O quarto estudo foi realizado no município de Carambeí, Paraná, em uma cooperativa agropecuária que atende a produção de milho, soja, feijão e de derivados de bovinos e suínos. O que a caracteriza é o desenvolvimento de sistemas de rodízio de plantios e a produção de derivados de bovinos e suínos com a utilização de significativo aporte técnico lá desenvolvido ou adquirido.
Além de tudo, a preocupação com o meio ambiente levou os cooperados a produzir energia a partir dos substratos gerados e a introduzir insumos como palha e esterco na cadeia produtiva.  A cooperativa dispõe de espaço comum para armazenagem, o que possibilita comercializar os produtos na época do melhor preço. Em comparação com os três casos anteriores, este empreendimento é bem mais sofisticado por compartilhar entre os cooperados técnicas desenvolvidas ou adquiridas, transportes, distribuição e comercialização.
A plataforma
A pesquisadora reuniu essa diversidade de observações e experiências para caracterizar a plataforma logística e social com base na gestão, nas operações e no desempenho. Definidos missões e objetivos, a gestão estabelece os procedimentos de como e aonde se quer chegar com o negócio. As operações envolvem o transporte, armazenagem, movimentação, sistema de troca de informações, equipamentos, materiais, ou seja, tudo que o cooperado precisa para sustentação da produção. O desempenho preocupa-se com a melhora contínua dos processos, de forma a atingir novos mercados, estabelecer novas parcerias, com o menor impacto sobre o meio ambiente.
Os estudos de caso mostram que os elementos logísticos não são devidamente operacionalizados, o que pode retardar o crescimento das organizações consideradas, cujos problemas podem ser resolvidos com a aplicação do conceito de plataforma logística social, que pode favorecer o desenvolvimento de atividades internas ao promover a integração dos pares, agilizar processos e também ampliar mercados.
Com base nesses parâmetros, a pesquisadora faz uma proposta de plataforma logística social que garanta o todo e a participação decisória dos cooperados, de forma que eles se conscientizem da necessidade de atuarem como produtores e gerenciadores de um negócio do qual são coparticipantes desde a produção. Enfatiza a importância do envolvimento de todos os associados nas decisões e a utilização do sistema cooperativo desde a compra das matérias-primas comuns até a comercialização, o que facilita negociações mais vantajosas nos preços dos insumos e na venda dos produtos.
A pesquisadora considera que “a plataforma é no fundo uma proposta de organização, constituindo um conjunto de metodologias, de ações, de procedimentos, de técnicas, de atitudes que devem ser implantadas em um sistema cooperativo com vistas a melhores resultados, destacadas e respeitadas as características particulares de cada uma das associações”.
Para a pesquisadora, a caracterização de plataforma logística social apresentada atinge pequenos produtores, que já conseguem individualmente até vender em mercados internacionais usando apenas a internet, que buscam eles mesmos a matéria-prima na natureza, que têm um diferencial de produto que chama a atenção pela beleza da peça produzida.  É preciso, diz ela, “fazer com que esses pequenos empreendedores consigam agregar cada vez mais valor aos seus produtos, a um custo menor, com vistas a novos mercados, porque dispõem de potencial para tanto, bastando que se organizem cooperativamente de forma mais eficiente. Tivemos também a preocupação com a continuidade do processo, propondo treinamentos cada vez mais contínuos para que o conhecimento de cunho familiar se perpetue. Mesmo porque existem artesãos antigos que nem produzem mais e não se pode permitir que seus conhecimentos e experiências se percam”.
Publicação
Tese: “Caracterização de plataforma logística para organizações sociais”
Autora: Christiane Lima Barbosa
Orientador: Orlando Fontes Lima Junior
Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)

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