Dois eventos chocantes e em sequência no último episódio da 2ª temporada deixaram os espectadores divididos.
By Leigh Blickley
30/05/2018
Um ano depois de primeira temporada de 13 Reasons Why, da Netflix, provocar debate sobre a maneira como foi mostrado o suicídio de uma adolescente, o responsável pela série, Brian Yorkey, lançou uma nova temporada de controvérsias.
Um episódio em particular está gerando discussões. E ele tem não apenas um, mas dois eventos que, juntos, correspondem a um final muito perturbador.
(Aviso: a descrição abaixo contém spoilers e pode ser considerada inquietante por alguns leitores.)
A segunda temporada de 13 Reasons Why retoma os acontecimentos do final da primeira. Os alunos da Liberty High School estão se recuperando da morte trágica de Hannah Baker (Katherine Langford) e a batalha judicial entre os pais da menina e a escola. Mas o último episódio se destaca na narrativa de Hannah. Ele mostra uma das cenas mais trágicas e horripilantes que já vi na TV.
A cena faz parte do 13º episódio, chamado Bye. Tyler (Devin Druid), que voltou à escola depois de passar por uma clínica de reabilitação comportamental por causa do vandalismo no campo de beisebol, é confrontado por Monty (Timothy Granaderos) e dois outros colegas. Monty, amigo do "vilão" Bryce (Justin Prentice) – que se safou do estupro de Hannah e Jessica (Alisha Boe) – ainda está se recuperando do fato de Tyler ter arruinado a temporada do time de beisebol da escola. Quando Monty vê Tyler de volta, planeja como vai se vingar.
Monty e seus amigos começam uma sequência de agressões raramente vista nas telas. Primeiro, eles batem a cabeça de Tyler no espelho e na pia. Enquanto Tyler está preso, eles o sodomizam com o cabo de um esfregão, enquanto o adolescente grita de dor. Quando eles terminam esse ato terrível de violência, os jovens largam Tyler no banheiro, apavorado, machucado e sangrando.
São dois minutos chocantes da história, que Druid e os colegas de elenco Boe, Dylan Minette, Ross Butler e Christian Navarro discutiram com o The Huffington Post numa entrevista recente.
Foi incrivelmente intimidador, porque de repente te dão essa responsabilidade de retratar essa coisa horrível que infelizmente acontece com muita gente no mundo inteiro, e com muita gente jovem.Devin Druid
"Quando chegou a hora do episódio final e Brian [Yorkey] estava me explicando o que iria acontecer com Tyler, foi incrivelmente intimidador", disse Druid na entrevista realizada em Nova York. "Porque de repente te dão essa responsabilidade de retratar essa coisa horrível que infelizmente acontece com muita gente no mundo inteiro, e com muita gente jovem."
"Mas, quando você pensa no que está fazendo e no impacto que aquilo pode ter na vida das pessoas", acrescentou ele, "você meio que sente uma sensação de fazer justiça e de achar que vai ajudar alguém. Isso me deixou mais tranquilo."
A "coisa horrível" mencionada por Druid, "que infelizmente acontece com muita gente", é uma referência à agressão sexual sofrida por seu personagem. Mas ela também pode ser referir à violência que Tyler quase comete contra seus colegas: logo depois da cena da sodomização, a série mostra Tyler tentando se vingar dos colegas de sala: ele vai a um baile da escola com uma arma automática.
E assim acaba a segunda temporada. Clay (Minette) em pânico, com a arma apontada para seu peito, implora para que Tyler pense no que vai fazer, enquanto ouvem-se sirenes ao fundo. "Não quero que você morra", diz Clay, chorando. Tyler parece estar em dúvida. "Vamos dar um jeito, juntos", diz Clay. Então, Tony (Navarro) chega e manda Tyler entrar no carro, deixando Clay sozinho, com a arma na mão e a polícia se aproximando.
É uma decisão que – como a cena do suicídio de Hannah na temporada passada – dividiu os fãs da série.
"13 Reasons Why não 'gera conscientização sobre saúde mental, bullying etc.' É uma série nojenta que mostra cenas horríveis/traumatizantes. Isso NÃO é gerar conscientização."
"13 Reasons Why é uma boa série, discute coisas (na minha opinião) de maneira respeitosa, mas temos de saber que ela TEM cenas gráficas e ela avisa isso várias vezes. Se você sofre de doença mental isso vai ser um golpe duro, não sou profissional mas eu não."
"13 Reasons Why só explora a ideia de doenças mentais para fazer dinheiro."
"Vocês não gostam de '13 Reasons Why' porque ela faz você falar e pensar em assuntos como estupro, suicídio e ataque sexual. Todos esses assuntos que as pessoas tentam ignorar, e viu o que acontece quando você ignora? Todas essas coisas continuam acontecendo."
"Realmente não sei como 13 Reasons consegue se safar mostrando o tipo de cenas que eles mostram, não sou uma pessoa sensível, mas isso revira meu estômago, Deus sabe o efeito que isso tem em quem passou por isso."
"Você pode falar merda de #13ReasonsWhy o quanto quiser, mas se 1% se sentirem melhor ou menos solitários a série terá cumprido seu papel. Cada um sofre com doença mental de um jeito diferente, então é impossível representar todo mundo."
"Sabia que havia alguns avisos, mas a cena [da agressão] foi muito vulgar e desnecessariamente desconfortável – não pela parte da sexualidade, mas por causa da intensidade e da emoção", disse ao HuffPost Kendal Wiley, de 19 anos.
Em entrevista ao site Vulture, Brian Yorkey defendeu a cena:
"Nessa série estamos comprometidos com contar histórias verdadeiras sobre coisas pelas quais os jovens passam, da maneira firme possível... a realidade é que, por mais intensa que seja a cena, e por mais fortes que sejam nossas reações, elas não chegam nem perto da dor sentida pelas pessoas que passam por isso de verdade."
"Levamos tudo muito a sério e acho que é uma responsabilidade enorme para cada um de nós, mas também um privilégio", disse Navarro ao HuffPost, observando que, trabalhando em 13 Reasons Why, espera-se que o elenco se manifeste sobre o tema polêmico da série.
"Não acho que nenhum de nós tenha imaginado que estaríamos numa série com esse nível de importância", disse ele. "O impacto aqui nos Estados Unidos e globalmente nos pegou de surpresa, então estamos lidando com isso todos os dias."
A série, disse Navarro, foi escrita e produzida antes dos vários episódios de violência armada em escolas americanas este ano. "Mas [ataques armados a escolas] são comuns e nossa série ajuda a começar um diálogo", acrescentou ele, "como aconteceu no ano passado com bullying e ataques sexuais. Espero que comece o mesmo diálogo em relação a armas."
"Esse é nosso objetivo com a série", disse Minette, "conversar com os adolescentes, com pessoas de todas a idades, começar um diálogo. Diálogos importantes."
É claro que debates públicos sobre armas existiam antes da estreia da segunda temporada de 13 Reasons Why. Eles também aconteciam antes de 2018, mas têm se tornado mais frequentes desde o massacre ocorrido numa escola de Parkland, na Flórida. Além disso, a conversa que começou com a série não se limita a ataques armados a escolas. Ele envolve uma agressão sexual brutal e um possível ataque a tiros, sugerindo relação entre os dois eventos.
O personagem de Tyler sofreu muito ao longo da série, de Hannah rejeitando seu pedido de desculpas por causa das fotos que ele tirou à decisão de Clay de compartilhar uma foto de Tyler com a escola toda. Esses momentos levaram bullies como Bryce e Monty a diminuir Tyler incessantemente. No final da primeira temporada, vemos Tyler comprando armas; no final da segunda, ele está pronto para usá-las.
Prenunciar essa trama é uma coisa. Forçar a cena trágica do estupro e a narrativa de um possível atirador na escola na última meia hora do episódio final é outra. A justaposição desses momentos é inquietante e leva o espectador a questionar os motivos dos roteiristas em quem ele depositou a confiança para retratar a vida dos adolescente fictícios. A sensação era que Tyler estava bem e saudável depois do tratamento, mas isso mudou rapidamente depois da crueldade inimaginável de Monty, levando Tyler a se vingar não só dos agressores mas da comunidade inteira. Terá sido exagero? Será que foi justo mostrar esse colapso de Tyler em alguns poucos minutos?
Sim, 13 Reasons Why mostra a realidade dos adolescentes para fãs fieis e interessados. (Segundo a revista Variety, o drama imediatamente chegou ao primeiro lugar das séries digitais originais logo após entrar no ar, no dia 18 de maio.) Mas a série não assume a responsabilidade completa pelo que mostra – em vez disso, sugere que as pessoas procurem um site, um guia de discussõese um programa em que o elenco discute o que se passou na série. Se houvesse mais tempo dedicado às consequências do estupro de Tyler, a trama teria mais impacto.
É claro que a Netflix está tentando usar essas ferramentas para minimizar as reações à primeira temporada, mas deixar os fãs – muitos deles jovens – com mais perguntas sem resposta sobre a relação entre o bullying extremo e a violência com armas pode não ser a melhor decisão.
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