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quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Como chegar à trégua dos sexos no trabalho

Uma pesquisa com 100 mil funcionários de grandes empresas mapeia os oito principais motivos para conflitos entre homens e mulheres no trabalho – e dá dicas preciosas para evitar os desentendimentos

GRAZIELE OLIVEIRA


Elas falam demais (Foto: Marcelo Min/ÉPOCA)O escritor americano John Gray ganha a vida resolvendo conflitos entre homens e mulheres. Seu livro Homens são de Marte, mulheres são de Vênus, lançado em 1992, vendeu mais de 50 milhões de exemplares e salvou inúmeros relacionamentos amorosos, ao mostrar que o amor e o diálogo podem superar as diferenças entre os sexos. Graças ao sucesso do livro, ele viajou pelo mundo dando palestras e estabeleceu uma lucrativa carreira de autor de autoajuda e conselheiro amoroso. Faltava-lhe a resposta para uma pergunta simples: o que fazer para conciliar as visões de mundo conflitantes de homens e mulheres no ambiente de trabalho – um lugar em que o amor provavelmente não estará presente para alinhar as órbitas de Marte e Vênus? 
Elas falam demais (Foto: ÉPOCA)Para encontrar a resposta a essa dúvida, Gray precisou de ajuda. Recrutou a consultora Barbara Annis, famosa por resolver conflitos entre homens e mulheres em governos e grandes empresas. A dupla dedicou 25 anos a estudar o assunto. Nesse período, entrevistaram 100 mil funcionários de 75 das maiores empresas do mundo, enquanto viajavam para oficinas, palestras e workshops. Foram ao Brasil, à Índia, ao Japão, percorreram toda a extensão dos Estados Unidos e da Europa. O resultado dessa longa pesquisa está no livro Trabalhando juntos (Paralela, 272 páginas, R$ 29,90), recém-lançado no Brasil. O texto cataloga as principais razões de conflito entre homens e mulheres e propõe algumas soluções. As diferenças entre os sexos são grandes, mas há motivos para otimismo. “Homens e mulheres sempre serão diferentes um do outro”, disse Gray a ÉPOCA. “O objetivo do livro não é o tentarmos ser iguais, mas entender as diferenças, respeitá-las e, juntos, criar algo melhor.”
O livro afirma que os motivos para desentendimentos entre os sexos são alguns pontos cegos. Da mesma forma como os retrovisores de carros nem sempre mostram aos motoristas tudo o que precisam ver, a mente masculina muitas vezes não repara em ações que incomodam profundamente as mulheres – e vice-versa. Em suas pesquisas, Gray e Barbara identificaram oito desses pontos cegos no ambiente de trabalho. Boa parte envolve diferenças no estilo de comunicação. Os homens recriminam as mulheres por fazer muitas perguntas. Elas reclamam por não ser ouvidas e se sentem excluí­das. As maneiras como homens e mulheres encaram problemas no trabalho também são diferentes. Elas se sentem pouco valorizadas num ambiente corporativo ainda dominado por homens e tentam mudá-lo, mas são tachadas de emotivas demais. Eles são considerados insensíveis, embora apenas prefiram não demonstrar emoções. E, quando querem conversar com elas, têm medo de ser mal interpretados. 
Por trás de todos os pontos cegos, há o mesmo problema: apesar de ser muito diferentes, homens e mulheres pensam pouco em suas diferenças. “Não saber como, e por que, homens e mulheres pensam e agem faz com que esses pontos cegos venham à tona”, diz Barbara.
A chave para superar esses obstáculos, segundo os autores, é desenvolver o que eles batizaram de “inteligência de gênero”: conhecer as diferenças entre a mente masculina e a feminina e lembrar essas diferenças na hora de interagir com as pessoas do sexo oposto. A analogia com os pontos cegos no trânsito funciona aqui de novo. Por mais que os retrovisores tenham pontos cegos, os motoristas conseguem trafegar com segurança e evitar a maior parte dos acidentes. Basta saber que os pontos cegos existem e dirigir com mais atenção. “Quanto mais cedo reconhecermos que meninos e meninas, homens e mulheres não são iguais, mais cedo passaremos a valorizar as diferenças e a encontrar a melhor relação de complementaridade”, afirma Barbara.
A busca por um ambiente de trabalho em que não haja conflitos entre os sexos começou nos anos 1960, como uma bandeira feminista, em protestos contra as condições desiguais de remuneração de homens e mulheres. Esse desequilíbrio ainda existe. No Brasil, estima-se que os salários masculinos sejam 35% maiores que os femininos. Na França, a diferença é um pouco menor: 25%. No Japão, chega aos 50%. Num ambiente em que homens e mulheres convivam melhor, essa diferença tende a diminuir. Isso beneficia não apenas as mulheres, mas toda a organização. Segundo a pesquisa A importância feminina: uma perspectiva latino-americana, da consultoria McKinsey, empresas com uma ou mais mulheres nos postos mais altos apresentaram um lucro 47% maior que aquelas em que há um desequilíbrio e essas posições são ocupadas apenas por homens. O estudo relacionou o desempenho financeiro de 345 empresas de capital aberto em seis países (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México e Peru) à proporção de mulheres ocupando cargos de diretoria. É a prova de que buscar a igualdade e resolver conflitos é um bom negócio para todos. 
Além da “inteligência de gênero” defendida por Gray e Barbara, há outras ideias para combater os conflitos. Entre elas estão as teses da antropóloga francesa Françoise Héritier, do Collège de France. Ao contrário de Gray, ela afirma que as diferenças entre homens e mulheres não são biológicas e universais, mas construções culturais. “A história, a cultura e a sociedade fabricam os conceitos de feminino e masculino”, diz a socióloga Helena Hirata, diretora de pesquisa emérita do Centro Nacional da Pesquisa Científica (CNRS), na França. Françoise baseia suas afirmações em longas pesquisas de campo feitas numa comunidade em Burkina Faso, publicadas em 1996. Segundo ela, os fundamentos biológicos comuns aos sexos são como letras num alfabeto. Sozinhas, não dizem nada. Cabe à sociedade formar frases – ou seja, transformar as características naturais de homens e mulheres em comportamentos. Uma japonesa e uma francesa são muito diferentes, embora sejam biologicamente semelhantes. Numa sociedade em que homens e mulheres fossem tratados da mesma maneira, as diferenças entre sexos não existiriam.
Gray reconhece a influência da sociedade. Mas afirma que sempre haverá diferenças entre homens e mulheres. “Questões culturais podem suprimir, enfatizar ou exagerar essas tendências, mas elas seguem existindo”, diz. A psicóloga Ana Cristina Limongi-França, coordenadora do núcleo de pesquisas em gestão de qualidade de vida no trabalho da Universidade de São Paulo (USP), concorda. “Existem mulheres que se aproximam mais de uma cultura masculina e vice-versa”, diz Ana. “Mas temos uma carga genética definida, desde a origem da humanidade.” Os homens tendem a usar mais a parte do cérebro responsável pelo raciocínio lógico, analítico e objetivo. As mulheres tendem a usar mais o lado responsável por um comportamento mais intuitivo, reflexivo e subjetivo. As duas formas de pensar têm valor para qualquer empresa. Desenvolver a “inteligência de gênero” no trabalho é uma maneira de aproveitá-las sem que Marte e Vênus entrem em choque. 
Guerra dos sexos - Samuel Bulcão, Jaqueline de Paula, Núbia Correia, José Ronaldo Rocha, Marjorie Kuin e Ricardo Teixeira (Foto: Marcelo Min/ÉPOCA; Ilustração: Luís Dourado)

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