por Larissa Saram
Advogada norte-americana que ficou famosa ao defender e ganhar casos como o da menina Naghma Mohammad fala sobre o trabalho de lutar pelos direitos da mulher em um país que se recusa a olhar para a causa feminina
A NORTE-AMERICANA KIMBERLEY MOTLEY MUDOU-SE PARA O AFEGANISTÃO EM 2008 PARA ORIENTAR ADVOGADOS OCIDENTAIS. HOJE, ELA É UMA DAS RESPONSÁVEIS PELAS PRINCIPAIS VITÓRIAS DAS MULHERES AFEGÃS (FOTO: REPRODUÇÃO/ FACEBOOK) |
É só dar uma busca rápida na internet com o nome Kimberley Mootley para entender a importância desta advogada norte-americana no universo dos direitos da mulher no Afeganistão. Radicada em Cabul desde 2008, ela ficou conhecida mundialmente em 2011, ao tirar a afegã Gulnaz, de 21 anos, da prisão. A jovem havia sido condenada depois de ter sido estuprada pelo primo do marido. Ela foi acusada de adultério e quase precisou se casar com o agressor para não ir para a cadeia.
Recentemente, Kimberley voltou a ser destaque em diversos veículos do mundo ao livrar Naghma Mohammad, menina de seis anos, de um casamento forçado com um jovem de 19. A garota foi usada como pagamento de uma dívida feita por seu pai.
"Vitórias como essas são o combustível que preciso para continuar ajudando essas pessoas", disse Kimberley em entrevista exclusiva para Marie Claire. A advogada, que vive longe do marido e das duas filhas adolescentes, conta sobre a vida em um país violento e como enfrenta as autoridades afegãs em nome de uma minoria constantemente violentada por leis e costumes machistas.
Marie Claire: Recentemente, seu nome se espalhou pela mídia internacional por conta de sua intervenção no caso da menina Naghma Mohammad, que aos seis anos foi obrigada a casar com um jovem de 19 como pagamento de uma dívida de seu pai. Como este caso chegou até você?
Kimberley Motley: São muitos os casos que chegam até mim durante o mês, a maioria deles pelas partes afetadas ou familiares. No caso de Naghma, pessoas ao redor do mundo ouviram falar sobre sua história e se perguntavam se havia um jeito legal de cancelar o casamento. Muita gente me procurou para intervir. E foi o que fiz.
M.C.: Por que decidiu defender a menina?
K.M.: Todos os casos que representei me emocionaram de alguma forma. No caso de Naghma, fiquei especialmente satisfeita com o resultado, porque tenho uma filha da idade dela e não consigo imaginá-la em tal situação.
M.C.: Você se mudou para o Afeganistão em 2008 e vive lá desde então. O que a fez tomar essa decisão?
K.M.: Inicialmente foi uma decisão financeira, pois fui enviada para lá para treinar e orientar advogados que trabalham em defesa dos afegãos. Então comecei a defender alguns clientes, a maioria homens do Reino Unido. Hoje, o que tem me mantido aqui são meus clientes que querem ser representados de forma ética, competente e efetiva. Com a benção e suporte da minha família, tenho sido capaz de deixar mais visível algumas situações jurídicas que eram invisíveis.
"COM A BENÇÃO E SUPORTE DA MINHA FAMÍLIA, TENHO SIDO CAPAZ DE DEIXAR MAIS VISÍVEL ALGUMAS SITUAÇÕES JURÍDICAS QUE ERAM INVISÍVEIS" (Foto: Reprodução/ Facebook) |
M.C.: Como começou a defender os direitos das mulheres afegãs?
K.M.: A partir do momento que senti que possuía experiência necessária para proporcionar a representação que elas mereciam. Tenho tido sorte de conseguir resultados bem-sucedidos. E isso está relacionado a forma de como conduzo os casos, sempre de acordo com a lei.
M.C.: Quais são as principais violações dos direitos das mulheres no Afeganistão?
K.M.: As mulheres são tratadas tão mal aqui que isso deveria ser olhado como uma questão catastrófica dos direitos humanos. Os castigos corporais, os casamentos infantis, os sequestros, são todos problemas reais que muitas mulheres afegãs temem legitimamente. As violações que as mulheres afegãs enfrentam é uma questão global e que precisa de atenção.
M.C.: Já sofreu algum tipo de ameaça?
K.M.: Sim. As questões de segurança têm deixado o trabalho que faço cada vez mais difícil. Durante o caso Gulnaz, uma jovem que foi condenada a prisão por adultério, após ser estuprada pelo primo do marido, minha casa foi saqueada e a energia elétrica foi cortada. Mas eu simplesmente continuei fazendo meu trabalho e nós ganhamos o caso, a jovem de 21 anos foi absolvida.
M.C.: Seu marido e filhas vivem nos Estados Unidos. Pensa em trazê-los para perto de você?
K.M.: Estar longe da minha família é sempre um desafio. Eu já pensei em trazê-los para Cabul, mas hoje já não é algo que eu considere fazer. Ainda pretendo voltar para os Estados Unidos.
M.C.: Qual é o seu maior sonho?
K.M.: Construir um Estado de direito como as pessoas merecem, em um nível global, e elevar o nível de representação legal internacionalmente.
M.C.: Você acha que um dia a situação das mulheres no Afeganistão vai melhorar?
K.M.: Eu certamente acredito nisso!
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