23/10/2015
Com exceção à escravidão, casos de trabalho infantil intenso e extremo abuso, essa é a primeira vez na história que largos contingentes de crianças não estão tendo a oportunidade de brincar, explorar livremente o ambiente e desenvolver as habilidades que florescem nesse tipo de atividade.
Essa é a opinião do pesquisador Peter Gray, autor do livro “Free to Learn” (Livres para aprender, em tradução livre). “Com mais e mais tempo gasto na escola, fazendo lição de casa ou em atividades ligadas ao mundo adulto, hoje temos crianças mais ansiosas, deprimidas e narcísicas. Isso é resultado da vida restritiva que impomos a elas hoje”, avalia Gray, em entrevista ao Public Radio International.
Segundo o autor, a humanidade, desde os tempos de caçador-coletor, sempre aprendeu a ser adulto, brincando. “É explorando livremente e jogando, desde os quatros anos, que as crianças desenvolvem habilidades essenciais de se relacionar, de resolver problemas e conhecer uns aos outros”, acredita o autor.
A opinião de Gray é uma das que embasa a cartilha“The Case For Play” (A Defesa Do Brincar, em tradução livre), da ONG australiana Playground Ideas, que defende que a brincadeira é um fator importante no desenvolvimento infantil e pode, inclusive, ajudar a eliminar desigualdades sociais e econômicas.
Brincar, necessidade humana
Em sua introdução, a cartilha nos lembra que a brincadeira é um fenômeno universal, encontrado em todas culturas humanas e em diversas espécies de mamíferos. Há, assim, uma conexão evolutiva profunda dos seres humanos com o lúdico, dimensão que cumpre um papel importante no desenvolvimento integral – cognitivo, afetivo e social – dos indivíduos. Com a vida institucionalizada e cada vez mais urbana da atualidade, a infância se encontra desalojada do seu direito ao brincar.
Criança que brinca, adulto que se desenvolve
Diversos estudos longitudinais – feitos ao longo de até quarenta anos-, mostraram que investimento em políticas de primeira infância têm enormes retornos sociais. Um deles, conhecido como “The Jamaica Study”, mostrou que crianças que tiveram estímulo ao brincar desde cedo se desenvolvem melhor.
O estudo acompanhou crianças que sofriam de desnutrição e viviam em comunidades vulneráveis. Elas passaram a receber, por dois anos, duas visitas lúdicas semanais. Vinte anos depois, os jovens que receberam esse cuidado tiveram salários 42% maiores, desenvolvimento cognitivo superior, habilidades psicossociais desenvolvidas e menor ansiedade e depressão.
Outra pesquisa, feita em escolas primárias, mostrou que, quando uma metodologia lúdica é aplicada desde cedo, os adultos apresentam maior escolaridade – foi registrado um aumento de 44% no ensino médio e 17% no nível universitário.
Direito ao brincar
Para reverter o quadro atual, a cartilha defende que governos, escolas, gestores e pais pensem e lutem cada vez mais por políticas públicas que garantam às crianças o direito ao brincar, sumarizados em três passos:
Garantir que toda criança com menos de 12 anos tenha acesso a um espaço seguro e estimulante para brincar - As escolas e creches podem funcionar como espaços garantidores deste direito, com prioridade para atividades ao ar livre.
Enfatizar a importância de brincar desde cedo - O brincar é importante para toda infância, mas até os três anos de idade são cruciais. Brincadeiras regulares podem ser um eficiente meio de combate aos efeitos negativos da vulnerabilidade social.
Priorizar o brincar como um direito básico de crianças em situações de crise - Em tempos de guerra, migração forçada e em campos de refugiados, brincar é essencial para contrabalancear os efeitos negativos das situações de emergência no desenvolvimento infantil.
O estudo completo, em inglês, pode ser acesso na íntegra na internet. Lá, o leitor encontra diversos insumos e pesquisas que ajudam a assegurar o direito a uma infância plena. Acesse “A Defesa Do Brincar”.
Portal do Aprendiz
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