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quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Protocolo quer evitar que crianças sofram ao falar sobre traumas

22/10/2014 São Paulo
Camila Maciel – Repórter da Agência Brasil/Edição: José Romildo

A adoção de um protocolo de procedimento destinado a evitar que crianças e adolescentes revivam momentos de abusos sexual é desafio a ser enfrentado pelos órgãos da infância e do Judiciário brasileiro, segundo concluíram profissionais do setor, reunidos em seminário organizado no auditório do Gabinete de Desembargadores (GADE), no centro de São Paulo.

O evento foi organizado esta semana pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) em parceria com organizações não governamentais.

De acordo com a secretária de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Angélica Goulart, já existe um grupo de trabalho com representação da sociedade civil para elaborar um protocolo brasileiro desse atendimento. “O Conanda [Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente] está produzindo, por meio do Conselho Federal de Psicologia e de Serviço Social, uma resolução que trata do atendimento de crianças em qualquer escuta [não só na Justiça] em todo tipo de atendimento. [As informações] estão sendo trazidas para alimentar o grupo de trabalho”, informou.

Perguntas e linguagem inadequadas à faixa etária, exigência de que a vítima preste diversos depoimentos, exposição ao agressor são exemplos de situações que podem resultar em novos traumas às crianças e aos adolescentes, disse o gerente de programas da Childhood (organização não governamental), Itamar Gonçalves.

Com o propósito de avançar na construção de um protocolo de acolhimento dessas denúncias, a entidade formulou um guia que indica que procedimentos devem ser adotados para garantir a proteção das crianças e jovens.

“Mais do que um espaço acolhedor, [é necessário] ter um profissional qualificado para conduzir a entrevista. Temos um desafio no Brasil: criar um modelo de escuta protegida para crianças e adolescentes”, acrescentou Itamar Gonçalves.

Documento da entidade informa que o Brasil tem cerca de 100 salas de depoimento especial, mas o atendimento não segue um padrão adequado para o atendimento de crianças e adolescente. A entidade montou projetos pilotos para testar um modelo de protocolo, no Rio Grande do Sul, em São Paulo e em Pernambuco. Ele é inspirado no modelo norte-americano, que reúne todos os profissionais no mesmo espaço, atuando de forma multidisciplinar.

Gonçalves destaca que o acompanhamento da vítima deve ocorrer antes e depois do depoimento. “A criança entra no sistema e vai ser cuidada o tempo todo. O horário de escola dela tem que ser respeitado. Ela tem que saber o que é uma audiência, onde ela está, onde está quem cometeu o crime”, disse. Ele lembra que o pano de fundo desse processo deve ser a proteção da criança e não somente a responsabilização do adulto.

“[A criança] vai falar de uma intimidade, de uma situação muito difícil, para pessoas que não têm a mínima identificação. Às vezes, isso ocorre na frente de quem cometeu o ato e com perguntas que não estão no cotidiano dela”, relatou.

O desembargador Antonio Carlos Malheiros, consultor da Coordenadoria da Infância e Juventude do TJSP, disse que depoimentos feitos por profissionais despreparados podem prejudicar o andamento da apuração. “A criança já está mortificada. Uma pergunta inadequada abre completamente a ferida. Se não souber [o procedimento correto fica] tudo estragado: [portanto] é preciso ser treinado”.

A formulação de uma política pública para a escuta de crianças e adolescentes, no entanto, é alvo de questionamentos por entidade representativa de psicólogos e assistentes sociais que atuam no TJSP. Para Elisabete Borgiani, presidente da associação representantes das duas categorias no tribunal, o ideal seria mudar a legislação para que crianças e adolescentes não tivessem a obrigatoriedade de prestar depoimentos. “Uma criança que foi vítima de um trauma, às vezes, demora para conseguir expressar [o que sofreu]. Para um psicólogo, o silêncio dela em sessão de escuta é mais significativa do que a fala”, disse. Ela disse que não é possível fazer a criança a falar da violência sofrida sem que haja sofrimento.

De acordo com Borgiani, a criação das salas de depoimento especial colocou os profissionais em uma condição em que é preciso levar a vítima a falar. “Existem situação em que a criança é inquirida por quatro horas”, relatou. No entanto, ela acredita que a memória traumatizada da vítima de abuso sexual não deveria ser usada como elemento para incriminar alguém. “Essa memória não é confiável, é fragmentada”, disse. O gerente de programas da Childhood, por outro lado, avalia que é preciso garantir o direito à fala de crianças e adolescentes.

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