A Espanha e a escola fora da escola
por Inés Benítez, da IPS
Málaga, Espanha, 24/4/2013 – Isabel Rodríguez decidiu tirar do sistema escolar institucional seu filho Ulises, de nove anos, e educá-lo em casa, uma alternativa escolhida por mais de duas mil famílias espanholas, que pedem ao governo a regularização e normalização desta opção crescente no país. “Penso que nas escolas não se oferece a educação ideal para as crianças”, disse Rodríguez à IPS, convencida de que os pais devem organizar o aprendizado no ritmo de seus interesses e suas necessidades. Ulises, hoje com 17 anos quer estudar desenho gráfico.
Outros casais que educam seus filhos em casa disseram à IPS que não buscam solucionar a questão do sistema escolar tradicional, nem pretendem criticá-lo ou substituí-lo. Querem apenas que as leis reconheçam essa alternativa para facilitar a obtenção de diplomas acadêmicos e a eventual incorporação ao ensino presencial de crianças e jovens.
“Queremos que seja desenvolvido um contexto legal que dê amparo e cobertura às famílias que escolhem esta forma de educar e, assim, acabe a perseguição que algumas estão sofrendo”, disse à IPS o professor Manel Moles, membro da Coordenadoria Catalã para o Reconhecimento e a Regulamentação da Educação em Família, nascida em Gerona, em 2007.
Algumas famílias são denunciadas às autoridades pela não escolarização de seus filhos sob o argumento de abandono ou absenteísmo escolar, mas poucas chegam aos tribunais. A legislação espanhola prevê dez anos de educação básica obrigatória, e essa escolaridade se entende que é presencial, embora não haja nenhuma disposição dizendo que o ensino em casa não é permitido.
A última sentença nesta matéria do Tribunal Constitucional data de 2 de dezembro de 2010 e nela tira-se a razão de alguns pais residentes na cidade espanhola de Málaga, obrigando-os a colocar os filhos menores na escola. A educação em família na Europa, escola em casa ou homeschooling, segundo termo procedente dos Estados Unidos, é legal na Áustria, Dinamarca, Irlanda, Itália, França e Portugal, segundo a tese, à qual a IPS teve acesso, OHomeschooling na Espanha: Descrição e Análise do Fenômeno, do doutor em pedagogia Carlos Cabo.
O modelo está arraigado nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha e é proibido na Alemanha e na Suécia. Uma integrante da Associação para a Livre Educação (ALE), que pediu para não ser identificada, contou à IPS que na Espanha há cerca de duas mil famílias que educam em casa e que seu número cresce na medida em que esta opção fica mais conhecida.
Uma mãe, que educa em casa seus três filhos, afirmou que, apesar dos estereótipos de homeschooling por motivos religiosos, é um fenômeno plural escolhido por famílias de classe média, de diferentes ideologias e variadas metodologias. Enquanto algumas se encarregam integralmente do ensino de seus filhos, outras contam com a ajuda de um professor.
Há casais que decidem cedo não escolarizar os filhos, enquanto outros chegam ao homeschooling devido a problemas de desatenção, fracasso ou assédio na escola pública ou privada, ou por necessidades educacionais especiais. “Minha filha de três anos se aborrecia na sala de aula, terminava rapidamente as tarefas e chorava. Agora, progride em casa e é feliz”, afirmou a integrante da ALE.
Para Isabel Rodríguez, a lei trata de proteger as crianças, salvaguardando seu direito à educação, “mas fica estreita” ao não reconhecer alternativas, como a educação à margem do sistema escolar. “Não há pedagogias, mas seres humanos”, disse à IPS uma mãe que educa em casa seus três filhos, entre três e 15 anos, que também preferiu o anonimato.
Outra reclamação destas famílias é dispor de uma via para que seus filhos obtenham o diploma de Educação Obrigatória aos 16 anos, como os demais. Atualmente, as crianças homeschoolers devem esperar até os 18 anos para fazer o exame. “É uma penalização de dois anos totalmente injustificada, que impede estas pessoas de poderem seguir em seus estudos superiores por um mero trâmite burocrático”, denunciou Moles, autor do livro Não Quero Ir à Escola.
Uma das críticas mais fortes contra a educação em casa é a que cita a falta de socialização das crianças. No entanto, “os pais são os primeiros interessados em que se relacionem”, argumentou Moles, por isso assistem aulas extra-escolares, painéis e se integram à comunidade. A ALE organiza periodicamente reuniões. “Eu preferiria ter ido à escola porque perdi o contato com as outras crianças”, disse à IPS uma mulher que pediu para não ter seu nome citado, lembrando como sua mãe, professora de profissão, não a levou à escola até os nove anos.
Também na Espanha há famílias que matriculam seus filhos em escolas de outros países, onde o ensino em casa está normalizado para ter acesso ao diploma, mas se deparam com problemas para que seja reconhecido, disse à IPS a advogada Laura Mascaró, mãe homeschooling e presidente da Plataforma pela Liberdade Educacional.
O Ministério da Educação conta com o Centro Oficial de Educação à Distância, mas é dirigido a crianças e jovens que trabalham no circo ou exercem profissões como cantores, atores ou esportistas de ponta, que os obriga a mudar de residência com certa periodicidade.
Mascaró, que acaba de regressar à Espanha após visitar México, Porto Rico, Argentina, Uruguai e Colômbia, disse à IPS que nesses países, como no Chile e Peru, “não se reconhece nem se proíbe a educação em casa. Permite-se porque há um vazio legal e não se produz nenhum tipo de registro nem controle”. Segundo a advogada, este fenômeno está crescendo na América Latina. No Uruguai está começando agora e no México é praticado principalmente por famílias católicas e evangélicas. Envolverde/IPS
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