mulheres1 Jovens indianas são presas fácies do tráfico humano
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Guwahati, Índia, 25/4/2013 – Um casal da comunidade adivasi parece já ter perdido a esperança de voltar a ver três de suas quatro filhas. O pitoresco entorno de sua casa, em um afastado povoado nas ladeiras do Himalaia, no Estado indiano de Assam, não condiz com seu vazio interno. “Pobres e ignorantes, os pais simplesmente não sabem para onde foram suas filhas”, disse Sunita Changkakati, diretora-executiva do não governamental Centro Assam para o Desenvolvimento Rural, de Guwahati.
Os adivasis são um povo aborígine. Seus ancestrais eram recrutados pelos colonos britânicos no centro da Índia e levados para trabalhar em plantações de chá em Assam. Esta comunidade sofre a ameaça das redes de tráfico de pessoas. Os traficantes chegam em busca de presas ingênuas, enganando-as com promessas de muito dinheiro, com a tentação da vida na cidade grande ou com a possibilidade de escapar de sua monótona existência.
Alguns inclusive insinuam a possibilidade de casamento, atraindo moças impressionáveis pelas quais dizem estar apaixonados e com as quais se “casam” em segredo. Contudo, em lugar da lua de mel prometida, as obrigam a se prostituir. Nos últimos anos, houve vários casos de destaque na imprensa de moças do nordeste da Índia, e de outras partes de Assam, que foram resgatadas de bordéis de Nova Délhi, Mumbai, Pune e outros lugares do país.
Segundo dados do Departamento de Investigações Criminais deste Estado, o número de moças vítimas do tráfico humano em Assam passou de quatro, em 2005, para 37, em 2009, 54, em 2011, e 70, em 2012. Mas estes dados podem ser maiores na realidade, pois os pais raramente denunciam o desaparecimento de suas filhas.
Nem todas as desaparecidas acabam no comércio sexual. Por estranho que pareça, muitas delas, algumas menores de 18 anos, se casam com camponeses muito mais velhos em Estados distantes como Punjab, fronteiriço com o Paquistão, e Hariana, vizinho deste último. O feticídio (morte de fetos) e infanticídio feminino distorceram a proporção de homens e mulheres nesses dois Estados do norte, e deram lugar à prática de “comprar” esposa, sem importar as diferenças culturais mútuas.
Outras vítimas do tráfico humano são trabalhadoras domésticas nas grandes cidades. Em geral “costumam ser mal remuneradas e têm uma situação de quase escravidão”, disse Stephen Ekka, da organização não governamental Pajhra (“fonte de vida”), na localidade de Tezpur, em Assam. “O tráfico não se refere apenas a pessoas que se vendem para o comércio sexual”, argumentou Ekka, ele próprio um adivasi. “Qualquer pessoa confinada sem seu consentimento a um trabalho pode ser considerada vítima do tráfico humano”, explicou.
Rajeeb Kumar Sharma, secretário-geral da Organização Global para o Desenvolvimento da Vida (Gold), de Guwahati, contou à IPS o caso de um trabalhador doméstico contratado por um agente de Nova Délhi que se queixava de dores estomacais. Levado ao hospital, descobriu que haviam lhe retirado um órgão sem seu conhecimento. Depois lhe disseram que, como seus empregadores haviam gasto muito dinheiro com ele, deveria compensar as perdas com o trabalho de outra pessoa de sua aldeia que não tivesse impedimentos físicos.
A pobreza e o desemprego criam desespero nas pessoas, e as convertem em presas fáceis do tráfico. A falta de mobilidade social, bem como de educação e oportunidades para os jovens, agravam o problema. As famosas plantações de chá de Assam, uma grande fonte de emprego e renda para a população local, atravessam tempos difíceis. Uma forma de reduzir os custos das empresas foi recorrer à mão de obra sazonal, especialmente na época da colheita. Neste contexto, não é raro que as moças busquem trabalho.
Mesmo nas aldeias mais isoladas, apenas mencionar o nome Nova Délhi equivale a pronunciar uma palavra mágica, que oferece um mundo de riquezas incalculáveis. Muitas vezes costuma aparecer de visita uma moça que afirma proceder da capital, vestida com roupas elegantes, muito maquiada e alardeando sobre todo o dinheiro que ganha. Mas é apenas uma estratégia para atrair jovens inocentes. Enganadas, muitas partem em busca de um sonho, e regressam depois de viverem um pesadelo, isso quando voltam.
Organizações não governamentais e grupos de estudantes colaboram para criar consciência sobre o problema, resgatar as vítimas e reabilitá-las. Vários grupos da sociedade civil começaram a implantar a Ujjwala, uma estratégia para combater o tráfico de pessoas, especialmente de moças obrigadas a se prostituírem. Foram criados comitês de vigilância que estão atentos a possíveis casos e trabalham em estreita colaboração com a polícia para resgatá-las.
No ano passado, 78 moças deram entrada em abrigos. A reabilitação das vítimas é difícil, especialmente se são recuperadas depois de vários anos, devido ao estigma social. “Algumas regressaram em mau estado de saúde”, contou Ekka, da Pajhra. “Parecem deprimidas, mas não querem falar muito sobre o que aconteceu com elas”, acrescentou. O Departamento de Investigações Criminais criou 14 unidades contra o tráfico de pessoas e vigia especialmente as estações de trens. Envolverde/IPS