Com a entrega das primeiras das 54 unidades móveis, que são destinadas duas a cada unidade da federação, grupo alerta para a continuidade de mobilização e monitoramento da prestação de serviços nos estados sobre a Lei Maria da Penha
“Essa luta não é fácil, mas vai ter que acontecer. As mulheres organizadas têm de chegar ao poder”. Embaladas pela cantiga, representantes de diferentes organizações de trabalhadoras rurais – de todo o país - deram início à Jornada das Margaridas. Essa mobilização se realiza todos os anos, na capital federal, quando da não ocorrência de marcha homônima, que reúne dezenas de milhares de mulheres. Elas reivindicam políticas públicas e a garantia de direitos, tais como aplicação da Lei Maria da Penha para as mulheres rurais, inclusão do nome da produtora em bloco de notas e acesso ao crédito.
Cerca de 50 ativistas começaram a agenda de encontros com autoridades do governo federal pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR). “Essa é a primeira audiência da Jornada das Margaridas e acontece aqui, na SPM, em reconhecimento ao trabalho da Secretaria. Estamos enfrentando o patriarcado e tivemos, em Alagoa Grande, um momento muito forte de combate à violência contra as mulheres no campo por meio da entrega das unidades móveis”, anunciou Alessandra Lunas, secretária da Mulher da Contag.
Ela participou do ato de entrega da primeira unidade móvel, feita pela ministra Eleonora Menicucci, da SPM, no início do mês em homenagem à memória de Margarida Maria Alves e de Penha Nascimento, trabalhadoras rurais paraibanas que lutaram pela conquista de cidadania. Referindo-se ao cumprimento de compromisso assumido pela presidenta da República, Dilma Rousseff, em 2011, com mais de 100 mil mulheres da Marcha das Margaridas, Lunas considerou que os ônibus, doados pelo governo federal, devem se tornar objeto de debate das mulheres do campo e da floresta.
“A gente sabe da importante conquista das unidades móveis para as trabalhadoras rurais. Mais do que conquista, é um novo desafio posto para a implementação das unidades móveis, para incidir no âmbito dos estados”, alertou. Ao citar os pontos de pauta da Jornada das Margaridas para a ministra Eleonora Menicucci, da SPM, – entre eles, saúde e autonomia econômica - Alessandra Lunas informou que, nesse ano, a estratégia é “bater na porta de cada ministério”.
Cobrança e conquista – Sentimentos misturados e a sensação de dever cumprido. A vice-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Carmen Foro, foi homenageada por ter sido a porta-voz da reivindicação das trabalhadoras rurais por anos e da exigência persistente de levar a Lei Maria da Penha para lugares remotos no interior do país.
“Não é só acesso, é acesso com qualidade e projetos novos. Trata-se de uma virada de postura do Estado brasileiro. Não seremos mais invisíveis. Trinta anos sem Margarida Maria Alves. Seus pensamentos e ideias atravessaram o tempo, nos motivam e nos dão energia para continuarmos a luta”, sentenciou.
Valores imortais - Trabalhadora rural, sindicalista, poeta e repentista, Maria da Soledade definiu: “a luta de Margarida Maria Alves resplandece e cresce por todo o Brasil. É luta e legado”. Num testemunho detalhado, recuperou o valor da ativista assassinada, há 30 anos, sem os culpados tivessem sido julgados.
“Marido e mãe pediram para que ela se afastasse da luta, mas ela não fugiu. Lutava não somente por carteira assinada, mas para que o trabalhador tivesse direito ao sítio, pudesse repousar aos finais de semana. Porque os usineiros queriam que o trabalhador estivesse na labuta de domingo a domingo, não tendo hora pra pegar nem pra largar o serviço”, enumerou. Mencionou o compromisso com a educação, porque o filho do trabalhador tinha de ter direito ao estudo para que não fosse negrinha de cozinha nem negrinho cambiteiro”, revelou.
Soledade desabafou que falta muito a ser alcançado em termos de direitos e valorização do trabalho no campo. “Mas já demos grandes passos. Na terra em que mataram Margarida, 30 anos depois, toda a terra é dos trabalhadores”, contou sobre ato ocorrido, em 12 de agosto, quando da devolução da usina à comunidade de Alagoa Grande. E rememorou as lembranças da companheira Penha Nascimento, a qual não esmoreceu e “tomou a frente para montarmos o movimento de trabalhadoras rurais” após o assassinato de Margarida.
Produtoras das matas – Francisca Vieira, do Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu, denunciou as sucessivas violências a que estão submetidas as mulheres no interior do país. “A gente é massacrada e sofre demais por ser negra, idosa e mulher. A violência não é só de morte, mas a que vai matando aos poucos. É a falta de estrada, terra. Se juntarmos todas elas, talvez sejam do tamanho do Brasil”, comparou.
A paraense Edel Moraes, vice-presidente do Conselho Nacional de Extrativistas, citou os nomes das produtorass rurais Letrícia, de Porto dos Mós, e Idalina “que estão sob a mira da bala”. E relembrou Maria e Zé Cláudio Por “tombarem na luta pela terra”.
Já Verônica, do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste, foi incisiva sobre os polos centrais da mobilização social. “Desde o início, acredito na Marcha das Margaridas. Nossa pauta é feminista. Como projeto político, nossa tarefa maior é vencer o patriarcado”, enfatizou.
Ao final da rodada, Maria da Glória da Silva, da Federação Nacional de Trabalhadores em Agricultura do Mato Grosso (Fetagri), pediu assessoria técnica para que possam fazer jus ao “Pronaf Mulheres, que é conquista das mulheres. E como tal, precisamos de apoio na hora de fazer os projetos”.
Além da ministra Eleonora, participaram da audiência a secretária-executiva da SPM, Lourdes Bandeira; a secretária de Autonomia Econômica, Tatau Godinho; a secretária de Articulação Institucional, Vera Soares; a secretária-adjunta de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, Rosangela Rigo; e a assessora especial para Questões do Campo e da Floresta, Raimudinha Mascena. O encontro ocorreu, na segunda-feira (19/08), em Brasília.
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