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quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Estranho na minha alma

Uma separação sempre causa estragos na alma, mesmo quando ela não nos pertence.

POR
Diana Corso

Edição 130


Fim do dia, das forças. O amigo liga chamando para um chope. Chegando lá, agradável surpresa: na mesa estava sua ex-mulher! Inevitável não fantasiar uma retomada, a separação sempre deixa uma ferida mal fechada, uma vontade de colar o que quebrou. Sempre gostei dela, do casal que eles faziam, mas eu sabia que aquele amor acabou. Havia escutado meu amigo o suficiente para saber que seu coração tomara outros rumos. Querê-los juntos novamente era egoísmo. Apesar disso, a conversa foi deliciosa como costumava ser no passado, estávamos relaxados, contentes. Depois, cada um foi pacificamente para seu lado, sem ressentimentos visíveis.

Amigos também ficam sequelados com os divórcios, sofre-se junto. A pior partilha, quando um amor acaba, é a dos afetos. Os que estão fora do relacionamento descobrem-se desagradavelmente dentro: são disputados, junto com livros e algum patrimônio. Os amigos raras vezes conseguem transitar igualmente entre ambos, sem ter que escolher. A posição é similar, embora menos grave, à dos filhos. Estes, no entanto, não podem, nem devem, nem querem se posicionar.

Quando a separação é tinta fresca, os ex-amantes estão loucos. Afogados em ressentimentos, exigem paciência budista. Descontam a perda em tudo o que passar pela frente. Os filhos, com o coração sem lar, precisam acolher a dupla de desequilibrados que substituiu seus pais. Os amigos sofrem mal menor, mas a intimidade transforma-se no muro das lamentações.

Fico triste, mas não desaprovo separações. Já entendi que vínculos terminais devem ser eutanasiados. Relações destruídas ou destrutivas podem consumir os envolvidos até o fim. Vi muita gente florescer após um recomeço, por vezes em um novo amor, outras em importante romance consigo mesmo. Mas sei o alto preço disso. Das separações que vivi, impossível esquecer a devastação, o vazio que restou. Dói, destrói. Conviver com um amigo separado é reviver esse luto. Nessa hora, o amor fraterno é imprescindível, mas nossa presença não tapa o furo.

Aquele entardecer, na presença de uma ferida cicatrizada, me encheu de energia. "Estranha no meu peito. Estranha na minha alma. Agora eu tenho calma. Não te desejo mais. Podemos ser amigos simplesmente. Amigos, simplesmente. E nada mais." A letra do compositor Fernando Lobo, na música "Chuvas de verão", traduzia o encontro com meus velhos amigos. O final feliz, por vezes, não é o dos contos de fadas, o casamento, pode ser também uma separação que finalmente aconteceu. Por que não?

Diana Corso é psicanalista. Em parceria com o marido, Mário Corso, escreveu o livro Fadas no Divã.

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